18.4.11

Verbo «sobressair»

Sem o filtro...

      Até os jornalistas já mordem nos heróis dos tempos modernos: «No filme que promove as novas chuteiras Mercurial Vapor Superfly, o jogador do Real Madrid [Cristiano Ronaldo] ao auto-elogiar-se comete um erro gramatical quando diz: “Este jogador sobressai-se muito”. E também na velha tradição de o bom jogador falar na 3.ª pessoa do singular...» («O protagonista», Paula Brito, «Notícias TV»/Diário de Notícias, 15.04.2011, p. 75).
      Mas é verdade: o verbo sobressair é erroneamente empregado como pronominal. A culpa também é do Dicionário Houaiss, que o regista como pronominal. É como diz Sacconi: o verbo «sobressair» não é pronominal desde o século XII...


Actualização no mesmo dia


      A pronominalização deste verbo pode ser resultado de cruzamento com outros com o mesmo significado, como salientar-se ou destacar-se.


[Post 4701]

14 comentários:

Bic Laranja disse...

E do «auto-elogiar-se», a lição...
Cumpts.

Paulo Araujo disse...

Mas o Houaiss ressalva:
"gram/uso a forma pronominal, embora registrável pelo menos no Brasil, talvez por influência de sinônimos como destacar-se, distinguir-se, não é aceita na norma culta da língua". Há dicionários descritivos, há-os prescritivos e há-os nas duas modalidades. E há os que se especializam também em descrever, prescrever e criticar; desde o prefácio.

Anónimo disse...

Deixai-me rir: «No filme que promove as novas chuteiras Mercurial Vapor Superfly, o jogador do Real Madrid [Cristiano Ronaldo] ao auto-elogiar-se comete um erro gramatical quando diz: “Este jogador sobressai-se muito”» — diz o roto ao esfarrapado. Pois o periodiqueiro perpetra outro não menor, e para mim até maior e pior, escrevinhando que o jogador comete um erro gramatical «ao auto-elogiar-se».
Auto-elogiar-se, deuses imortais! Eu autolavo-me, tu autolavas-te, ele autolava-se, nós autolavamo-nos, vós autolavais-vos, eles autolavam-se. Ah português de uma cana!
— Montexto

Venâncio disse...

Montexto,

Para você, tudo o indica, auto-elogiar-se é tão escandalosamente redundante como descer para baixo. Não me parece. Também na redundância há graus.

Venâncio disse...

Julgo que sobressair-se será decalque dum uso castelhano. No Google, há 83 casos de "se sobresale mucho". Trata-se dum uso marginal, decerto, mas possivelmente "in".

Anónimo disse...

No mesmo Google, 21.500 resultados para "sobressair-se".

Anónimo disse...

«Auto-elogiar-se» e «auto...» seja o que for não é só «escandalosamente redundante», é principalmente monstruoso e — muito pior, pelo menos para mim — uma abdicação soez.
Mais uma folga do idioma, que continua de férias, e teima em não tornar ao serviço.
— Montexto

Bic Laranja disse...

O caso é que os verbos pronominais sobressaem cada vez mais sem o pronome. É o prefixo um alvor da futura sintaxe?
Cumpts.

Venâncio disse...

Anónimo,

Esse resultado (21.500) é de "sobressair-se". O de sobressair-se é de quase 400.000... Agora ajunte-lhe as formas finitas. Só sobressai-se conta 316.000.

Bem pode pregar Frei Montexto.

Anónimo disse...

Um sinal do futuro, ou lá como é que diz o outro. Muito audível para novíssimos jornalistas escritores e outros estilistas do idioma em folga.
— Mont.

Anónimo disse...

Repare melhor, Venâncio. Frei Montexto não pregou uma só palavra contra «sobressair-se». O uso de verbos de ordinário transitivos como intransitivos, e vice-versa, e como pronominais, é coisa mais variável e lábil do que parece aos inocentinhos da última hora. Já aqui o disse mais de uma vez. Lembra-se de Castilho e até Camilo terem escrito: «estava-me eu ali à sombra de umas carvalheiras», ou coisa que o valha?
Mas «auto-elogiar-se» ou auto-intitular-se» ou «autolavar-se» ou «autoflagelar-se» e decorrências e escorrências deste calibre é que nunca houve pena que se sujasse com elas, enquanto não se deu folga ao idioma, e foi havendo vergonha na cara.
— Montexto

Bic Laranja disse...

Ou sair-se.
Cumpts.

Venâncio disse...

Montexto,

Nitidamente, você não sente a diferença entre, por um lado, «autoflagelar-se», «auto-intitular-se», «auto-elogiar-se» e, por outro, esse seu arrancado a ferros «autolavar-se».

É assim que procedem os essencialistas do idioma. Foi assim que procederam as Academias e seus secretários. Obrigando a língua a ser... racional. Ora o idioma convive bem com um nadinha de ruído, um tudo-nada de redundância.

Anónimo disse...

Estão exactissimamente no mesmo caso. Mas hoje o ruído e a redundância e o descuido e a impropriedade e o crasso erro excederam muito o «nadinha». E as academias até podem ter forçado os idiomas à racionalidade, no que estariam no seu papel; mas isso terá sido in illo tempore, agora o «romantismo» tomou-as também a elas, que querem ser «sensíveis» e — Deus me perdoe! — até «artistas», e sentem essas diferenças todas tão finamente como o caro Venâncio.
— Montexto