Muito me conta
No Portugal em Directo de ontem, na Antena 1, foi entrevistado o presidente de uma câmara municipal. Discurso normal, linguagem corrente, mas, de súbito, inesperado, sai um «botar». Regionalismo, claro, e não, como alguns crêem, arcaísmo. Isto mesmo afirmou F. V. Peixoto da Fonseca, mas acrescentou isto: «Só seria arcaísmo se se tivesse deixado por completo de usar a partir de 1500, mais ou menos.» Alguém sabe alguma coisa destas contas? Para mim, e decerto que para a maioria dos leitores, arcaísmos são palavras, formas ou expressões antigas, que deixaram entretanto de ser usadas. Podemos depois acrescentar que uns são arcaísmos lexicais e outros são sintácticos.
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Actualização no mesmo dia
«Dizem que o português é o único idioma em que se botam as calças e se calçam as botas» (Os Pecados da Língua: Pequeno Repertório de Grandes Erros de Linguagem. 2.º Vol., Paulo Flávio e Paulo Sampaio. Porto Alegre: AGE, 6.ª ed., 2002, p. 40). No Brasil, é assim.
«Dizem que o português é o único idioma em que se botam as calças e se calçam as botas» (Os Pecados da Língua: Pequeno Repertório de Grandes Erros de Linguagem. 2.º Vol., Paulo Flávio e Paulo Sampaio. Porto Alegre: AGE, 6.ª ed., 2002, p. 40). No Brasil, é assim.
Nem arcaísmo nem regionalismo. Puro português da melhor cepa, usadíssimo pelo imperador da língua portuguesa, por muita e boa gente que eu conheci e conheço, e por este vosso criado.
ResponderEliminar- Montexto
Caso interessante, este.
ResponderEliminarDiria que é um regionalismo, isto porque a norte de Coimbra, e só aí, botar é sinónimo corrente de pôr ou deitar. Tem, pois, um estatuto que a sul nunca teve.
Verbo principal («Bota isso fora») ou auxiliar («Botou-se a estudar»), é um elemento do galego-português que nunca penetrou em terras meridionais.
Não é, pois, um arcaísmo. Vive onde sempre viveu.
«Usadíssimo pelo imperador da língua portuguesa»...
ResponderEliminarÓ Montexto, tenha piedade. Encontrei, em Vieira, 4 casos. Haverá mais um ou outro, mas é tudo.
Para mais, Vieira era um brasileiro. Não admira, pois não?
Voltando a um assunto já aqui abordado: hoje ouvi, na SIC e num curto espaço de dois minutos (o vídeo está em http://videos.sapo.pt/cZ5iSZTEUcWCdkjREMAR), a palavra «período» ser pronunciada «periúdo» oito vezes, por três pessoas diferentes, incluindo a jornalista. Mais uma luta perdida, esta.
ResponderEliminarRS
A propósito do imperador da língua portuguesa, parece que o tempo vai passando, e as modas e os escritores sucedendo-se uns aos outros, mas os melhores continuam a reconhecer-lhe esse império: ao sentir de Pessoa e Saramago juntou-se agora o de J. Rentes de Carvalho (blogue «O Tempo Contado», «O gigante da LER», 23.III.2011): «Ao afirmar que António Lobo Antunes é um gigante– os séculos o dirão – George Steiner não caiu do pedestal onde merece estar, mas quebrou-se-lhe a redoma onde eu ao longo de todos estes anos o mantive. Porque, sejamos razoáveis, se sabemos, para só citar estes, a que craveira chegam Shakespeare ou Tolstoï, e George Steiner sabe-o como poucos, torna-se dolorosa a ligeireza do seu qualificativo.
ResponderEliminar»E vamos lá ver: quantos gigantes há no milénio da nossa literatura? Posso desfiar nomes grandes, mas gigantes? Chamasse eu gigante a Eça de Queiroz, a quem imensamente admiro, logo ele lá de cima atiraria um cínico "Ó menino, tenha juízo!". Camilo, Camões, Pessoa, Bocage, Gil Vicente, Fernão Lopes, gente de grande valia, mas aquém daquele que em minha opinião é o nosso e único gigante literário: o Padre António Vieira.»
´Parece que os caldos de Vieira, de que falava Herculano, continuam a receitar-se.
À consideração dos novíssimos.
- Mont.
Portanto, a norte de Coimbra, terra onde se fez a língua, que se vai desfazendo para sul, «apud» José Leite de Figueiredo, «Lições de Filologia Portuguesa», região. Vieira, nado e extinto no séc. XVII, brasileiro, porventura regionalista. E em Vieira 4 exemplos e talvez mais um.
ResponderEliminarMuito edificado fico, e vou meditar seriamente nestes adminículos para uma compreensão actual da língua portuguesa e seus cultores máximos.
Vi a luz.
- Mont.
Cá no Brasil, também se usa "botar" a torto e a direito. No Rio Grande do Sul, onde moro, posso afirmar que é correntíssimo. Não saberia dizer se o é na mesma intensidade em todos os estados.
ResponderEliminarJamais o tomaria por arcaísmo.
«Periúdo» pronunciado por «período» há-de ser evolução da língua a sul de Coimbra, verdadeiro centro do país em todos os sentidos, e mormente do idioma, que muito tem medrado desde que, comparado com ele, tudo o mais é mera região.
ResponderEliminar- Mont.
A avó da senhora costuma dizer em dia de eleições que vai "botar o voto" (eu já lhe aproveitei o dizer mais que uma vez).
ResponderEliminarÉ de Pombal, que fica já a Sul de Coimbra, e tem 92 anos (quase do tempo de Vieira).
Cumpts.
«Periúdo», «mediúcre», e há outro que não me vem agora. São invenções lisboetas. E isto há largos decénios. Ainda o juvenil Montexto não era nascido.
ResponderEliminarNo Nordeste do Brasil não se põe, não se coloca; bota-se ou mete-se.
ResponderEliminaro Houaiss registra 32 acepções e onze locuções com 'botar'.
Um regionalismo.
ResponderEliminar- Mont.
Ainda ninguém se pronunciou sobre os séculos de pousio para que um vocábulo possa ser considerado arcaísmo. E em Portugal alguma vez se usou o termo bota-fora para designar o lançamento de um navio à água? Gosto da palavra.
ResponderEliminarCerto. E mais: o arcaísmo ou, pelo menos, alguns arcaísmos podem ressuscitar. E ainda mais: antes pecar com arcaísmo do que com um neologismo.
ResponderEliminarCuido que ninguém ousa tachar este de arcaísmo; de «regionalismo», admite-se - durante os tais cinco minutos do velho Cândido.
- Mont.
Quanto aos séculos para se considerar um vocábulo arcaico, penso que a exigência de 500 anos seja um disparate sem fundamento.
ResponderEliminarE sobre a atualização do dia: muito bem lembrada essa singularidade. Assim o dizemos cá, sem vergonha nenhuma.
ResponderEliminarE o mesmo idioma em que se diz 'pois sim!' para negar, e 'pois não' para concordar.
ResponderEliminarPara a marcação lexicográfica 'arcaísmo' cada qual tem sua regra; para o Houaiss, "... classificaram-se de arcaísmos as palavras ou variantes usadas no português medieval até ao português camoniano (século XVI), quando o seu emprego se extinguiu dentro dese âmbito temporal." Faz ainda distinção para certos vocábulos como antigos, obsoletos e os da arqueologia verbal (ex.: daduco).
ResponderEliminarEstamos com o mesmo problema de ontem. Mas isto vai passar.
ResponderEliminarO que, de certeza, ajuda muito é a noção de «arcaizante». É bem mais elástica que a de «arcaísmo», ao permite caracterizar quaisquer palavras do antigamente... Julgo que, para alguém de 15 anos, uma palavra como disquete é arcaizante.
Venâncio
Olá, bom dia!!! Ao realizar uma pesquisa na internet, deparei-me com este blog que chamou minha atenção. Sou brasileira, moro na região Nordeste e amo, literalmente, a Língua Portuguesa. Na realidade, não saberia explicar a razão pela qual nutro esse sentimento ao longo da minha vida, às vezes, impressiono-me com o encantamento que sinto ao lê um simples comentário escrito com base na Língua Portuguesa originária de Portugal. Caros leitores e blogueiros, sou apenas uma apreciadora desta língua tão requintada e bela, entretanto, sabemos que, em se tratando de Brasil, a Língua Portuguesa é falada e registrada de forma bem diferente, mas apropriada, uma vez que a língua é viva, está em movimento, ou seja, evolui, e, portanto, está aberta a variações. Parabéns pela iniciativa da criação do blog. Sucesso!!!
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