19.5.07

Semântica: «ladrão»

Língua pérfida

Antigamente, só havia ladrões no exército. Agora, há-os em todo o lado. É uma injúria, esta afirmação, diz? E o leitor acha que eu sou ingénuo? Explico (e quebro o protocolo de leitura): os mercenários que faziam parte da escolta dos imperadores romanos chamavam-se latro (latronis), e servir no exército dizia-se latrocinare. Como é que de soldados, latrones, é certo, passaram a ladrões propriamente ditos? Com a dissolução do Império Romano, o salário (salário porque eram pagos em sal, tal como os cartéis da droga pagam em cocaína aos seus mercenários) destes mercenários começou por ser irregular, até que deixou de ser pago. Nesta altura, e porque tinham o direito de usar armas e necessidade de se alimentarem como todos os mortais, passaram a salteadores, ficando assim fixado o significado actual da palavra «ladrão». Percebem agora a afirmação inicial? Já muito diferente é a frase, que joga com a ambiguidade, que me enviaram recentemente: «Os autarcas portugueses são os mais católicos do mundo: não assinam nada sem levar um terço.»

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