24.7.07

Etimologia: gaforina, marrafa

Retrato de Elisabetta Gafforini: http://purl.pt/

Pilosidades


É interessante ver como a partir de certa altura a moda passou a consagrar o nome de certas figuras da sociedade. Quando hoje usamos o termo «gaforina», a quem ocorre logo que provém do nome de uma soprano italiana, Elisabetta Gafforini, que passou no início do século XIX pelo Teatro de S. Carlos? Tirando o penteado espalhafatoso, só sabemos que era senhora de uma voz límpida, ressonante e dúctil. Eça de Queirós, nas Cartas de Paris (II), usa o termo: «A sua aparência era hoffmânica; duas longas pernas de cegonha triste, olhos rutilantes numa face ascética e uma gaforina descomunal, crespa, revolta e cor de estopa.» E, antes, já António Feliciano de Castilho o fizera: «— Acabou-se a tua enfiada de despropósitos? — perguntou D. Luís, dando em face do espelho o último toque de pente à gaforina e ao bigode» (Mil e Um Mistérios, Capítulo XXII).
Nos cortes masculinos, foi o dançarino italiano Marraffi, que também passou pelo Teatro de S. Carlos, ainda no final do século XVIII, que deu o nome à marrafa. Antes, para as mulheres, os penteados à Pompadour tinham estado em voga. Mas ainda o cabelo. À escovinha, à garçonne, à inglesa, à máquina zero, à tigela, afro, carapinha, carrapito, grenha, guedelhas, juba, madeixa, mecha, melena, poupa, rabo-de-cavalo, repas. Rente. E as tranças, os totós e os bandós. Intonso. As cãs, os caracóis e as ondas. E o cabelo de Medusa transformado, por castigo, em serpentes. E o cabelo de Sansão. E os capachinhos e chinós. E o peyos dos judeus. E o sendi dos hindus. E dos iogues o xendi. E o chindim no alto da cabeça. E o rabicho dos antigos chineses. E os bigoudis («“Papelotes”, vizinha, diz-se “papelotes”!»). E o contrário disso: os calvos. Glabros. Glabriúsculos. Glabérrimos. E a tonsura. Para ficarmos ainda em França, foi lá que nasceu o general Louis-Eugène Cavaignac (1802-1857), que deu nome ao cavanhaque, agora quase esquecido. E as peras, a barba passa-piolho (como a do presidente do Sindicato dos Jornalistas, Alfredo Maia), as suíças, a costeleta, as favoritas e as patilhas. E o bigode calamistrado. E as guias enceradas. E Hanun, que rapou metade da barba dos servos de David. E os leigos ou conversos barbati. Nome feminino a condizer com este texto é Madalena, que vem do hebraico e significa «a dos cabelos penteados». Mas não vale a pena chorar nem ficar pelos cabelos.

1 comentário:

Unknown disse...

Belo trabalho!

E como se chegou a gadelhas?

Há ainda o caso "moustache"...

Boa continuação.

Será que gaforina deu nome de gente, tal como Marrafa?

Gostaria de encontrar dados biográficos do tal Marraffi... pode dar uma ajuda?

José Silva (zehelmer@portugalmail.com)