25.8.07

As palavras e a lei

Isto e aquilo

Não é raro falar-se nas faculdades de Direito da deficiente técnica legislativa, censurando-se muitas vezes que a redacção das leis seja entregue a pessoas formadas, se formadas são, noutras áreas do saber. De facto, pôr engenheiros a fazer leis é tão mau e perigoso como pôr advogados a construir pontes. Infelizmente, esta comparação somente servirá de lição quando virmos pontes concebidas por advogados, o que até hoje ainda não aconteceu. A propósito de técnicas legislativas, trago hoje um exemplo de falta de clareza do texto da lei, mas aqui intencional, atribuível à pudicícia carminada dos tempos. Trata-se da Portaria n.º 69 035, datada de 1953, da Câmara Municipal de Lisboa, a propósito dos bons costumes em locais públicos. Eis o texto:
«Verificando-se o aumento de actos atentatórios à moral e aos bons costumes, que dia a dia se vêm verificando nos logradouros públicos e jardins e, em especial, nas zonas florestais Montes Claros, Parque Silva Porto, Mata da Trafaria, Jardim Botânico, Tapada da Ajuda e outros, determina-se à Polícia e Guarda Florestais uma permanente vigilância sobre as pessoas que procurem frondosas vegetações para a prática de actos que atentem contra a moral e os bons costumes. Assim, e em aditamento àquela Postura n.º 69035, estabelece-se e determina-se que o art.º 48.º tenha o cumprimento seguinte:

1.º Mão na mão...............................2$50
2.º Mão naquilo..............................15$00
3.º Aquilo na mão...........................30$00
4.º Aquilo naquilo...........................50$00
5.º Aquilo atrás daquilo...................100$00

Parágrafo único
Com a língua naquilo, 150$00 de multa, preso e fotografado.»

2 comentários:

Anónimo disse...

Com a globalização, a portaria da Câmara Municipal de Lisboa deveria prever outros atos atentatórios à moral e aos bons costumes, como boca naquilo (mais pecaminoso do que língua naquilo) e charuto naquilo (direitos autorais para Bill Clinton).
A portaria é digna de figurar no Festival de Besteira que Assola o País (FEBEAPÁ) criado por Stanislaw Ponte Preta (pseudônimo do escritor Sérgio Porto), em 1966, no Brasil, para registrar as façanhas de militares obtusos, políticos toscos, funcionários públicos kafkianos e outros “cocorocas”.
O Festival relaciona, por exemplo, a portaria do Delegado de Costumes de Belo Horizonte, proibindo a visita de Pierre Cardin, que lançaria a minissaia, sob a alegação de que ninguém levanta a saia da Mulher Mineira.

Helder Guégués disse...

Pois é, a estupidez não tem fronteiras.