13.5.09

Auxiliar «haver»

Último reduto

      Os falantes têm uma ideia mais ou menos clara de que o modelo mais utilizado na língua portuguesa para a formação de tempos compostos é ter + particípio passado e que o modelo haver + particípio passado tem um acentuado recorte literário e formal, sendo a diferença meramente estilística. Mais ainda, alguns saberão que este último modelo é muito usado na variante brasileira da língua. Contudo, nas traduções, por motivos que não são imediatamente claros, encontramos o último reduto, defendido por tradutores e revisores, desta construção. Numa obra que estou a ler, De Bom a Excelente, de Jim Collins (com tradução de Paulo Tiago Bento e revisão de Ayala Monteiro. 4.ª ed. Lisboa: Casa das Letras, 2008), são inúmeros os exemplos desta construção: «Smith, o advogado de modos suaves da empresa, não tinha muita certeza de que o conselho de administração houvesse feito a escolha certa — e essa dúvida foi reforçada no momento em que um dos directores falou com ele à parte e lhe lembrou que lhe faltavam algumas das qualificações necessárias à posição» (p. 39). «Voltámos a insistir, sublinhando que havíamos seleccionado as empresas bom para óptimo a partir de um desempenho que ultrapassava a média do sector» (p. 61). «Afinal, não havíamos encontrado provas de que as empresas bom para óptimo tivessem sido abençoadas com mais sorte (ou, no caso, com mais azar) do que as empresas de comparação» (p. 62). «Começámos então a reparar no padrão simétrico que apresentavam os executivos das empresas de comparação: eles atribuíam grande parte da culpa à sorte, lamentando-se frequentemente das circunstâncias que haviam encontrado» (p. 62). «Olhando para a evidência empírica, notámos que alguns dos líderes do nosso estudo haviam passado por experiências de vida significativas que talvez tenham iniciado ou estimulado o processo de maturação» (p. 66)…

1 comentário:

Paulo Bento disse...

Agradeço o seu interesse pela obra. A principal razão para a opção prende-se com o evitar de formas do verbo ter na mesma frase, como acontece nalguns dos exemplos que apresenta. Nos casos em que não está presente esse motivo, terá sido certamente uma questão estética tomada no momento, mas terei em atenção em futuros trabalhos o possível exagerado recorte literário dessa utilização.
Paulo Tiago Bento