21.12.10

«Teraelectrão-volt». Plural

Se não for, está mal


      Filomena Naves entrevistou o director do CERN, Rolf Heuer, para o Diário de Notícias. Eis a primeira pergunta: «O LHC está a operar desde Março a um nível de energia nunca antes atingido por uma máquina: 7 teraelectrão-volt (TeV). Está para breve a descoberta do bosão de Higgs (a chave para explicar a origem da massa das outras partículas elementares)?» («‘Dentro de dois anos podemos ter grandes novidades’», Filomena Naves, Diário de Notícias, 20.12.2010, p. 30).
      Não faltam fontes em que se lê precisamente o mesmo. Contudo, o plural de electrão-volt não é electrões-volt? Então o plural de teraelectrão-volt terá de ser teraelectrões-volt.
      No recentíssimo Decreto-Lei n.º 128/2010, de 3 de Dezembro (cuja referência agradeço ao leitor Fernando Ferreira), diploma que actualiza o sistema de unidades de medida legais, transpondo a Directiva n.º 2009/3/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Março, alterando pela segunda vez o Decreto-Lei n.º 238/94, de 19 de Setembro, no uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 18/2010, de 16 de Agosto, não se lê, naturalmente, nada sobre o plural de «electrão-volt». Nem fala de «teraelectrão-volt», nem seria necessário, pois publica uma tabela com os múltiplos e os submúltiplos e uma alínea estatui: «Os nomes dos múltiplos e submúltiplos são formados pela simples junção do prefixo ao nome da unidade.» Nem uma palavra sobre o plural das unidades, que, salvo melhor opinião, devem seguir as regras gerais da língua. Sobre plurais, somente isto, questão para a qual já aqui chamei a atenção bastas vezes: «Os símbolos das unidades ficam invariáveis no plural.» Os símbolos, não as unidades.

[Post 4212]

7 comentários:

Anónimo disse...

O plural de «electrão-volt» é tudo menos consensual. Tenho visto «electrão-volt», «electrões-volt», «electrão-volts» e até «electrões-volts». Se formos pela maioria, a escolha será «electrões-volt». Mas será que a maioria tem razão? Vejamos. Por definição, um electrão-volt (1 eV) é a energia cinética que um electrão (ou qualquer partícula com a mesma carga eléctrica de um electrão, carga essa representada pela letra "e") adquire ao atravessar, no vácuo, uma diferença de potencial eléctrico de um volt (1 V). Se pedirem a um físico para definir 4 eV, a primeira coisa que lhe ocorreria seria dizer que é a energia cinética que um electrão adquire ao atravessar uma diferença de potencial de 4 V. Não deixa de ser verdade que também é a energia cinética que 4 electrões adquirem ao atravessar uma diferença de potencial de 1 V, mas não seria essa a primeira imagem que um físico teria. Daí que a opção por «electrão-volts» até faça mais sentido. Aliás, em inglês é mesmo assim que se pluraliza: «electron-volts»; nunca vi escrita a expressão «electrons-volt». Quanto à opção pelo plural «electrão-volt», usada no artigo do DN, ela pode também ser justificada com o facto de «volt» ser uma unidade derivada do nome de um cientista (Alessandro Volta), pelo que há quem, como eu, defenda que estas unidades nunca devem ser pluralizadas. A última possibilidade, «electrões-volts», é provavelmente a que menos argumentos tem a seu favor.

Fernando Ferreira

Helder Guégués disse...

Em suma, é mais uma área crítica da língua portuguesa. Contudo, continua a afigurar-se-me que electrões-volt é a melhor opção.

Anónimo disse...

«As you like it.»
- Montexto

Anónimo disse...

Não quis alongar-me demasiado no meu anterior comentário, mas a verdade é que há razões ainda mais profundas para defender o plural «electrão-volts» contra o mais usado «electrões-volt». Assim, por exemplo, nunca poderíamos traduzir 7,5 eV como a energia cinética de 7,5 electrões após atravessarem uma diferença de potencial de 1 V, porque não existem 7,5 electrões. E nem sequer podemos admitir a possibilidade de outras partículas, porque a carga eléctrica está quantizada, sendo o seu valor absoluto mínimo, precisamente, a carga "e", e só se encontrando na Natureza múltiplos inteiros desta carga (nunca foram detectadas experimentalmente partículas livres com carga inferior à de um electrão). Logo, a única tradução natural de 7,5 eV é como sendo a energia cinética de um electrão após atravessar uma diferença de potencial de 7,5 V.
Independentemente destas reflexões, basta ouvir algumas pessoas da área para se perceber que «electrões-volt» não é mais comum do que «electrão-volts». Ou seja: a predominância no registo escrito não tem correspondência na oralidade.

Fernando Ferreira

Anónimo disse...

No que respeita aos plurais de unidades derivadas de cientistas, o Fernando Ferreira tem razão. Lembro-me de dois ou três professores que tive que estavam sempre bastante atentos a esta questão. E ai do aluno que dissesse "pascais" ou "newtons"!

Anónimo disse...

No Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, o plural escolhido foi "electrões-volts". Efectivamente, parece não haver entendimento. Ou não parece haver entendimento. (Aqui, tanto faz.)

Anónimo disse...

Eu, a julgar por mim e seguindo o pendor da língua, sem mais explicações científicas, formaria o plural em «electrões-volts»; mas, como o Dicionário da Academia consignou esta forma, já pensaria duas vezes...
- Montexto