Três coisinhas
1. Lusitania, Ok! teleseguros, Açoreana… São nomes próprios, sim, mas forjados, inventados. Logo, porque não Lusitânia, Telesseguros, Açoriana? Seria menos rendoso.
2. O chefe, muito reputado, mandou dizer que era mesmo «abóbora Hokkaido bebé» que queria escrever, e não «abóbora-menina». (Nem potimarron, supomos.) Seria menos saborosa.
3. Num espaço aberto (open space, como agora se acha inevitável dizer e escrever), até o paginador se intromete na conversa do director. Este falava em CDS (credit default swaps, uma espécie de seguro que os credores contratam para se protegerem de perdas no caso de os Estados não cumprirem as suas obrigações de reembolso dos títulos) e do valor que dantes tinham. «O Partido do Táxi», comenta o paginador. Espaço compartimentado seria menos democrático.
[Post 4702]
14 comentários:
Chefes, chefes... Quase sempre, os que menos sabem.
É mandá-los ao Mourinho da escrita criativa, que promete pô-los todos a escrever com sujeito, verbo e caso em menos de um santiámen.
*
Sim, já me tinham chamado a atenção para essoutro despautério do «espaço». Sim, acabaram de entrar em órbita...
— Montexto
Essa de C. Kupo sobre a sabedoria dos chefes faz-me aludir aqui a uma que acabei agora de ouvir no programa televisivo Cuidado com a Língua!. Estava lá o cómico a falar (esqueci-me do nome) e pronunciou a palavra «realizar» no sentido já nosso conhecido e exprobrado de «compreender»; repreenderam-no; e ele, logo a emendar para «aperceber-se». Saiu de um anglicismo recente e caiu num galicismo já maduro: não se pode por isso dizer que foi pior a emenda que o soneto. Mas, logo a seguir para ilustrar o emprego bárbaro de «realizar», escolheram precisamente uma cena com o machucho da CGD a discursar e a queixar-se, também perante a comunicação social, de não sei que «as elites ainda não realizaram», etc., etc. E lá recebeu também o seu quinau.
Mas, a meu ver, o prócere até tinha razão, noutro sentido: as «elites» portuguesas há muito que se deixaram de realizações, e passaram à fase da «desrealização», também no sentido que a minha 8.ª do da Porto Ed. aponta a este termo em filosofia e sobretudo em psicologia. De escóis (se alguma vez o foram) descambaram em escolhos até que a história as varra quais escórias.
— Montexto
Só um apontamentozinho.
Em neerlandês, chama-se a esse "espaço aberto" um kantoortuin, um escritório-jardim.
[«Kantoor» provém do fr. comptoir, «tuin» é etimologicamente aparentado com o ingl. town].
É só uma amostra (outras há) da inventividade linguística dos arquitectos de interiores.
P.S.
Com maior exactidão (e fazendo mais jus à criatividade), deveria traduzir-se «kantoortuin» por jardim tipo escritório. Há logo outra largueza.
Só que a expressão «tipo isto, tipo aquilo» também não me cheira... Mas há-de haver aí mais uma diferença qualquer que me escapa...
— Montexto
Escritório aberto substitui perfeitamente o original 'open office', também muito usado pelos pedantes "interior designers".
É falta de hábito, Montexto. Veja esse só que, a adversativa que importámos do Brasil nos anos 70, e que, bons céus, até você já usa. O Mundo está mesmo perdido.
A falta de hábito não será só minha. Haja vista este blogue a 12.04.2011.
Quanto a «só que», então mestre Aquilino deve-o ter introduzido já do além nas suas obras. Lá terei de consultar a vidente Maia.
— Montexto
Montexto,
Antes de 1960, praticamente não há usos de só que adversativo em Portugal. Um raro caso em Eça, um raro caso em Aquilino, um raro caso em Tomás de Figueiredo. Um maior contacto com o Brasil e com brasileiros vai, desde então, introduzindo o giro. Por 1975 (com a chegada das telenovelas brasileiras) ele cresce exponencialmente. Nesse estado está hoje.
Você é um filho do seu tempo. Quem o diria?
Só por cima... da minha ignorância e por descuido. Mas com mestre Aquilino já me vou dando por tranquilizado. «Só que» sempre é preferível ao adversativo «simplesmente», franciú puro, muito lá de casa de José Maria, esse moço que sabia dar erros com graça, apud Camilo, e eu não desminto.
— Montexto
Sim, o simplesmente adversativo entra na língua portuguesa nas últimas Farpas de EQ, em 1871, e julgo que custou a pegar.
Eu gosto muito, e uso bastante. Que posso eu fazer?
Montexto,
Noventa por cento, e porventura mais, de tudo quanto escrevemos veio de fora do território português. E não vejo em que é que Paris seja mais sujo. Fique bem.
Sabe certamente melhor do que eu que isso não é argumento para se ajuizar da legitimidade ou ilegitimidade de uma palavra ou locução em português.
— Montexto
Enviar um comentário