22.4.11

Verbo «encher»

Seis cestos cheios de enchidos

      «No século XVII, em Inglaterra, os termómetros eram cheios com brandy em vez de mercúrio.» (Sabia, caro Fernando Ferreira?) Bem, a dúvida está em saber se é «cheios» ou «enchidos». O verbo encher, como muito bem lembrou F. V. Peixoto da Fonseca, só tem um particípio passado — «enchido». «Cheio» é adjectivo. Não sei se é fácil encontrar uma gramática actual que corrobore a afirmação.
      «— Há quem diga que ele não está na cova absolutamente. Que o caixão foi enchido de pedras. Que algum dia ele voltar [sic] de novo» (Ulisses, James Joyce. Tradução de António Houaiss. Lisboa: Difel — Difusão Editorial, 2.ª ed., 1983, p. 114).

[Post 4715]


5 comentários:

Anónimo disse...

Dúvida? Só para pirrónicos militantes.
Mas, se as gramáticas actuais ainda não admitem «cheio» como particípio e frases dessas como correctas, decepcionam-me, pois constituem mais um erro que já lá devia constar. Lá chegarão. «Encher» só tem «enchido» como particípio, que por isso entra assim na passiva como na activa: «o caixão foi enchido de pedras», «tinham enchido o caixão de pedras». Mas também «empregar» só tem «empregado», e «encarregar» só tem «encarregado», e todavia em muitas já lá cantam o «empregue» e o «encarregue», e usados até na voz activa, desbancando de todo as únicas formas correctas em ambas as vozes. E mais: «aceso», «preso», «aceite», «morto», «pago, «gasto», «ganho» existem realmente como particípios irregulares, destinados portanto à passiva: «foi aceso», etc.; mas quem não os lê nem ouve por aí a torto e a direito na activa: «tinha aceso», «tinha preso», «tinha aceite», «tinha morto», «tinha pago», «tinha gasto», «tinha ganho»?
Portanto, — adjectivos empregados (ou empregues, como escrevem os novíssimos) como particípios, — particípios irregulares inventados, — particípios irregulares empregados no lugar dos regulares... Salve-se quem puder!

*
Ah! Na frase «Que algum dia ele voltar de novo» não há gramática.
— Montexto

Bic Laranja disse...

Parece que se fina o idioma! Tão morto de o terem matado como de ter morrido.
Cumpts.

Anónimo disse...

Não seria 'voltará'?

Helder Guégués disse...

É «voltará», sim, mas na edição citada está a gralha. Numa edição brasileira, leio «voltará».

Anónimo disse...

Eu não sabia, Helder; obrigado pela informação. Estive a investigar e constatei que a descoberta deste facto é relativamente recente (foi publicada em 1997, na revista Annals of Science, por Jacob Adler) e veio alterar ligeiramente a história do desenvolvimento do termómetro. Na prática, um termómetro de brandy é essencialmente um termómetro de álcool, e já se sabia que os primeiros termómetros eram de álcool. (O álcool e o mercúrio foram os líquidos mais usados porque têm altos coeficientes de dilatação volúmica.)

Fernando Ferreira

P.S. A resposta vem atrasada pois só hoje retomei o trabalho, e estou a actualizar-me na leitura do blogue.)