Prof. Diabo
Já o padre António Vieira dizia, no «Sermão dos Cativos», que até com o Diabo se tem de aprender. Lembro isto a propósito da crónica de Vasco Graça Moura no Diário de Notícias (11.1.2006), absolutamente virulenta, ácida, desproporcionada — mas dada numa escrita muito vernácula, sobrecarregada, retorcida — contra Mário Soares. Tudo sem nunca o nomear. A verdade é que, sendo VGM um grande escritor, por vezes um autêntico prestidigitador verbal, também desliza para as inépcias, pois escreve várias vezes, ou não fosse o título «A má disposição», «mal disposto». «Ele acordou muito mal disposto», escreve. Erro o dele: a começar pelo Vocabulário de Rebelo Gonçalves, todos os dicionários registam «maldisposto», que é o particípio passado do verbo maldispor.
Claro que, nos jornais, os revisores se genuflectem perante o mestre, acatando-lhe mui respeitosamente os sagrados erros. Imbuídos da filosofia de Ortega y Gasset, que definiu o estilo como «la peculiar manera que en cada autor hay de desrealizar las cosas», suspeitam que é ou uma liberdade poética ou uma busca de sentido que lhes escapa inteiramente, escapando à gramática. Ajoujados pelo peso da estarem a rever um texto do génio, nunca suspeitam que o homem não é perfeitamente infalível. Sacrificam a ortografia à humildade, prestando assim um péssimo serviço à língua e aos leitores.
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