Para inglês ler
Com o tempo, os dicionários unilingues de português vão-se tornando menos úteis do que dicionários bilingues, em especial os de inglês/português. O que é, diga-se já, atribuível em grande parte aos jornalistas.
Foi com muito agrado que li na obra Tudo o que se passa na TSF — … para um «livro de estilo» (Editorial Notícias, 2003), da autoria de João Paulo Meneses: «O uso de estrangeirismos na comunicação social (um dos prazeres secretos de muitos jornalistas!) é uma forma de erudição. Mas não é a única. Há outras maneiras de contrariar (consciente/inconscientemente?) aquilo que todos aceitam serem duas das principais regras da escrita — neste caso — da rádio: simplicidade e clareza. Na “aldeia global”, os estrangeirismos são cada vez mais frequentes e inevitáveis, mas nem por isso mais desejáveis ou correctos. Como regra, devíamos recusar todos os estrangeirismos, embora se aceitem algumas excepções. Quais? Aquelas palavras que sabemos serem já do domínio público e que admitimos pertencerem ao universo lexical dos nossos ouvintes (ou seja, aquelas que são descodificáveis de imediato)» (pp. 141-142).
À luz desta regra, tão sensata e enunciada por um jornalista, é claro que é completamente injustificável o uso de «draft» na citação que se segue. «Esta proposta consta de um draft da Unidade de Missão para a Reforma Penal, dirigida por Rui Pereira, que vai entregar no início de Novembro ao Governo o projecto de lei de política criminal. […] A discriminação racial, religiosa ou sexual também faz parte, no draft que a Unidade de Missão já elaborou, das prioridades da política criminal» («Mulheres grávidas que abortem não devem ser julgadas», Ana Sá Lopes, Diário de Notícias, 12.10.2006, p. 19).
O que a jornalista pretendia comunicar não o pode ser na língua portuguesa? Faltam-nos termos para o exprimir? Pelo contexto, parece tratar-se do que em inglês se diz «draft material», algo como «projecto de documento», «projecto de lei» (expressão que a jornalista acaba por usar na primeira frase) ou mesmo «documento intermédio» ou «documento provisório».
Gostava de ver a jornalista Ana Sá Lopes entrar em cafés e centros comerciais, por este país fora, e perguntar aos leitores do Diário de Notícias se perceberam a notícia nesta parte.
«Draft: c.1500, spelling variant of draught (q.v.) to reflect change in pronunciation. Meaning “rough copy of a writing” (something “drawn”) is attested from 14c.; that of "preliminary sketch from which a final copy is made" is from 1528. The meaning “to draw off a group for special duty” is from 1703, in U.S. especially of military service; the v. in this sense first recorded 1714. Draftee is from 1866. Sense in bank draft is from 1745» (Online Etymology Dictionary).
Com o tempo, os dicionários unilingues de português vão-se tornando menos úteis do que dicionários bilingues, em especial os de inglês/português. O que é, diga-se já, atribuível em grande parte aos jornalistas.
Foi com muito agrado que li na obra Tudo o que se passa na TSF — … para um «livro de estilo» (Editorial Notícias, 2003), da autoria de João Paulo Meneses: «O uso de estrangeirismos na comunicação social (um dos prazeres secretos de muitos jornalistas!) é uma forma de erudição. Mas não é a única. Há outras maneiras de contrariar (consciente/inconscientemente?) aquilo que todos aceitam serem duas das principais regras da escrita — neste caso — da rádio: simplicidade e clareza. Na “aldeia global”, os estrangeirismos são cada vez mais frequentes e inevitáveis, mas nem por isso mais desejáveis ou correctos. Como regra, devíamos recusar todos os estrangeirismos, embora se aceitem algumas excepções. Quais? Aquelas palavras que sabemos serem já do domínio público e que admitimos pertencerem ao universo lexical dos nossos ouvintes (ou seja, aquelas que são descodificáveis de imediato)» (pp. 141-142).
À luz desta regra, tão sensata e enunciada por um jornalista, é claro que é completamente injustificável o uso de «draft» na citação que se segue. «Esta proposta consta de um draft da Unidade de Missão para a Reforma Penal, dirigida por Rui Pereira, que vai entregar no início de Novembro ao Governo o projecto de lei de política criminal. […] A discriminação racial, religiosa ou sexual também faz parte, no draft que a Unidade de Missão já elaborou, das prioridades da política criminal» («Mulheres grávidas que abortem não devem ser julgadas», Ana Sá Lopes, Diário de Notícias, 12.10.2006, p. 19).
O que a jornalista pretendia comunicar não o pode ser na língua portuguesa? Faltam-nos termos para o exprimir? Pelo contexto, parece tratar-se do que em inglês se diz «draft material», algo como «projecto de documento», «projecto de lei» (expressão que a jornalista acaba por usar na primeira frase) ou mesmo «documento intermédio» ou «documento provisório».
Gostava de ver a jornalista Ana Sá Lopes entrar em cafés e centros comerciais, por este país fora, e perguntar aos leitores do Diário de Notícias se perceberam a notícia nesta parte.
«Draft: c.1500, spelling variant of draught (q.v.) to reflect change in pronunciation. Meaning “rough copy of a writing” (something “drawn”) is attested from 14c.; that of "preliminary sketch from which a final copy is made" is from 1528. The meaning “to draw off a group for special duty” is from 1703, in U.S. especially of military service; the v. in this sense first recorded 1714. Draftee is from 1866. Sense in bank draft is from 1745» (Online Etymology Dictionary).
1 comentário:
que tal "rascunho"?...
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