24.8.08

«Nelson» e «Nélson». «Triplo salto»


Vamos contá-los

Muito curioso: o Diário de Notícias, entre outros jornais, escreve sempre «Nélson Évora». O Record, «Nelson». No que se refere aos nomes próprios, já sabem, respeito sempre (até para que sempre me respeitem) a forma como os escrevem quem os tem. A fonte mais acessível é o sítio do atleta, em que se pode ler «Nelson Évora».
Estabelece a Instrução n.º 38 do Vocabulário Ortográfico Resumido da Língua Portuguesa, da Academia das Ciências de Lisboa (1947): «Para ressalvar de direitos, poderá ser mantida a grafia dos nomes próprios adoptada pelos seus possuidores na assinatura, bem como a grafia original de firmas comerciais, nomes de sociedades, marcas e títulos inscritos em registo público.»
A primeira página do Record que ilustra este texto é paradigmática. Por um lado, grafa «Nelson Évora», por ser, estou convencido disso, o nome do atleta; por outro, grafa «Nélson», o lateral-direito do Benfica. Não, não é a minha influência a fazer-se sentir. Não concordo com tudo, de resto. Porquê «triplo-salto»? É, tanto quanto sei, o único jornal que escreve assim. O que é que o atleta faz? Dá três saltos: primeiro, segundo, terceiro. Triplo salto. Só há uma obra a registar a ortografia «triplo-salto»: o Novo Prontuário Ortográfico de José Manuel de Pinto Castro.

3 comentários:

Anónimo disse...

Nos jornais desportivos, há matéria para este blog, até 2056.

Parabéns
Miguel Ferreira

Tó Portela disse...

Caro Hélder,

regressado de férias, esta é a segunda vez que lhe escrevo (a primeira foi por causa de um "post" sobre pontuação), e mais uma vez porque estou em desacordo consigo. Seja como for, gosto muito de ler o seu blogue – para não pensar que isto é só deitar abaixo –, e o facto de lhe estar a escrever é prova disso mesmo.

Tal como o Hélder, defendo que se deve respeitar a forma como aqueles que são referidos na imprensa escrevem os seus próprios nomes, contudo considero, e por isto ter acontecido também no jornal no qual sou revisor (“perdi” na votação intra-revisão que decidiu essa matéria...), que é uma aberração escrever "Nelson Evóra", e não "Nélson Évora". E por várias razões:

a) os pais do atleta são cabo-verdianos, e, até dando de barato que, no registo costa-marfinense onde o nome do pequeno Nélson foi pela primeira vez "oficializado", se tenha escrito "Nelson", seria preciso honrar essa primeira circunstância (aliás, quase que aposto que, na certidão de nascimento, também vem escrito "Evora" e não "Évora");

b) as entrevistas do próprio atleta indicam que ele se trata a si próprio por "Nélson" e não "Nelsôn" (como um colega, o "Nêlso", que eu tive na primária...);

c) ele naturalizou-se português, afinal, o que me parece mais um motivo para dar força a que se escreva “Nélson”;

d) e porque, ao ler-se “Nélson” para o jogador do Benfica, agora do Bétis, só se pode concluir pela incoerência do "Record", pois, se o Hélder vir o (magnificamente concebido e deliciosamente visitável) sítio do próprio defesa-lateral, o www.nelson22.com, verá que ele se trata a si próprio por “Nelson”.

Assim sendo, parece-me que a questão aqui é: deve confiar-se em quem quer que seja o webmaster dos sítios destes dois Nélsons ou num revisor que sabe as regras da antroponímia da língua portuguesa? Eu confio mais no segundo. (Até pelo nível cultural dos informáticos da minha empresa...)

Não defendo, claro, que o jogador do Blackburn Ryan Nelson passe a Ryan Nélson, mas, no caso de dois jogadores de um PALOP, ainda por cima naturalizados portugueses, parece-me que a opção “Nelson” é a opção indolente. Toda a regra, no fim de contas, é confirmada por excepções, e os revisores devem saber que a flexibilidade tem de fazer parte da sua maneira de abordar a riqueza da língua. Aliás, é a única maneira de a acompanhar.

Neste caso, saúdo, por isso, o jornal “A Bola”. Ia saudar o “Público”, mas eles mudam de “Nelson” para “Nélson” no mesmo parágrafo, quando não na mesma frase...

Continuação de excelente trabalho. Um abraço,

Miguel

Helder Guégués disse...

Caro Miguel
Muito obrigado pelo seu comentário. Ora, se «os revisores devem saber que a flexibilidade tem de fazer parte da sua maneira de abordar a riqueza da língua», como o Miguel, e muito bem, advoga, deve admitir que há mais do que uma grafia para vários nomes: «Nélson» e «Nelson», «Hélder» e «Helder». Os nomes próprios escapam, em boa medida, às regras rígidas da gramática. Já aqui abordei diversas vezes esta questão. Costumo exemplificar com o diplasiasmo presente em inúmeros apelidos portugueses. É, quase sempre, quanto basta.
Cordialmente,
Helder Guégués