28.3.09

Sobre a dupla grafia

Falta o melhor

Enquanto não houver um vocabulário ortográfico comum, o Acordo Ortográfico de 1990 não terá uma aplicação sensata nem uniforme. Nos últimos dias, tenho visto como as confusões à volta do conceito de dupla grafia já vão fazendo estragos. Os falantes não se entendem e, ainda pior, os linguistas também não. Haverá dupla grafia quer no âmbito da língua portuguesa como um todo, ou lusofonia, como agora se diz, em especial na oposição variante brasileira/variante luso-afro-asiática, quer no âmbito mais restrito da mesma comunidade linguística. Assim, no âmbito mais alargado, no Brasil continuará a escrever-se, por exemplo, fato e recepção, o que corresponderá a facto e receção em Portugal. No âmbito da mesma comunidade, a oscilação de pronúncia relativamente às consoantes mudas c e p (cacto e cato, dicção e dição, sector e setor, etc.) também conduzirá a uma legítima dupla grafia. É assim errada a noção, largamente difundida, de que o novo acordo ortográfico permite uma ampla liberdade na grafia.
É decerto muito útil haver já uma nova edição do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) da Academia Brasileira de Letras com as novas regras ortográficas. Até o podemos entender como um passo oportuno e mesmo decisivo para termos um verdadeiro vocabulário ortográfico comum, como exige o preâmbulo do acordo, mas a verdade é que são contributos como o da Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP), que entregou na Academia das Ciências de Lisboa (ACL) um vocabulário com léxico comum a Portugueses e Galegos, que edificarão um vocabulário ortográfico comum. Falta agora o melhor: fazer-se esse vocabulário ortográfico comum que contemple todas as variantes e estabeleça as duplas grafias para cada país signatário.

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