20.5.10

Espanholismo

Olé!


      «Todo um blockbuster, com mais entradas do que mostras de grande público como A Evolução de Darwin, que no ano passado se tornou na exposição temporária mais visitada de sempre em Portugal (161 mil visitantes na Gulbenkian). Mais entradas também do que o inesperado sucesso que foi a retrospectiva em 2006-2007, ainda na Gulbenkian, de Amadeo de Souza-Cardoso, que superou as 100 mil visitas» («Joana Vasconcelos é todo um blockbuster de 168 mil visitantes», Clara Campanilho Barradas, Público, 20.05.2010, p. 44).
      Sim, há males maiores, mas um espanholismo assim tão evidente e escusado perturba sempre muito. E ainda mais no título: es todo un. Se não têm tempo de rever tudo (não são, sequer, revisores), espera-se ao menos que façam o que dizem que lhes compete fazer: «os copydesks dedicam especial atenção a títulos, pós-títulos, entradas, legendas, início e fim dos textos; conferem ainda a observância das regras gráficas mais relevantes que caracterizam o PÚBLICO».
      Na conversa de ontem, a copidesque do Público referiu enfática e repetidamente a questão que a deixou de cabelos em pé: chegou um dia ao jornal (os conluios, é da própria definição, são sempre nas nossas costas) e viu que se tinha começado a usar o termo da linguagem desportiva «contra-relogista». «Uma coisa abstrusa, impensável. Como é que pode ser? O que é um “relogista”?»
      Procurei saber quantas palavras temos em português começadas por contra- e acabadas com o sufixo nominal -ista (e o verbete relativo a este sufixo está deficientemente redigido, incompleto, no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora). São quatro: contrabaixista, contrabandista, contrapontista e contratista. Depressa descobri que não era aqui que estava a resposta (até porque não é o radical que atribui categoria sintáctica à palavra), mas tão-somente em saber a que palavras se acrescenta o sufixo. Junta-se a substantivos, simples (alarmista) ou compostos (água-tintista) e a adjectivos, simples (acacianista) ou compostos (zen-budista). Sendo assim, não vejo qual é o problema com o neologismo «contra-relogista».
      Para terminar: grave é aquele blockbuster, ainda para mais repetido. E parece-me usado com pouca propriedade.

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