Uma maneira de dizer
Mais um obituário não assinado no Diário de Notícias. Morreu o chefe (o DN continua a preferir-lhe o galicismo chef, mas no título usou o despretensioso termo «cozinheiro») catalão Santi Santamaría. «O cozinheiro foi ainda autor de algumas polémicas, muito devido à rivalidade com outro chef catalão, Ferran Adrià» («O cozinheiro catalão das sete estrelas Michelin», Diário de Notícias, 17.02.2011, p. 47).
«Autor de polémicas» é uma maneira de dizer, talvez inadequada. Se tivesse gostado de contar anedotas, chamá-lo-íamos porventura «autor de anedotas»? Fazia afirmações polémicas (ou só provocadoras: «A boa cozinha defeca-se.»), gostava de travar polémicas, de polemicar.
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13 comentários:
É só mais um exemplo do confusionismo imperante na construção frásica e relação forçada de conceitos. Como Catão advertia contra os Cartagineses, repito eu contra os tais que votam à língua uma fé também toda púnica: escrevem por aproximação e de outiva. Bons para se renovarem neles as velhas cantigas de escárnio e maldizer.
— Montexto
Mergulhando fundo na etimologia, Santamaría e Adrià foram protagonista e deuteragonista, respectivamente, na gastronômica polêmica; ou vive-versa? Numa sentença interrogativa vernácula, cinco bem perceptíveis étimos gregos.
O Houaiss diz que sentença como frase ou oração é diacronismo obsoleto. No português europeu também não a usamos muito.
De qualquer modo não deixa de ser curiosa essa quantidade de étimos gregos. Para quem, como eu, sabe tão pouco de grego, o sempre eficiente e educado Paulo Araújo não se importará de identificá-los.
Sendo cinco, tenho medo de cincar se me deitar a adivinhar.
Gosto de usar sentença (acepção 9 do Houaiss), no sentido lógico de proposição, por ser um conceito que me parece mais abrangente, salvo opiniões contrárias e melhores, que acato.
Quanto aos étimos gregos, inclua a própria palavra 'etimologia' e chegará à contagem de cinco exemplos. Sou admirador do português arcaico, medieval, obsoleto, talvez por ser de uma região 'adonde' ainda se diz 'adonde' e 'prumode'. Se Bilac estiver certo ao considerar o português 'a última flor do Lácio, inculta e bela', temos de nos admirar com sua riqueza etimológica ao incorporar celtíberos próprios do Condado Portucalense, não de toda Iberia, grego, latim, árabe, provençal, catalão, castelhano, etc., e, ainda assim, ser um das poucas línguas que pode ostentar como nome o próprio gentílico; veja-se o caso do espanhol e do italiano, e mesmo do francês, que não 'existem', são apenas denominações políticas. Não diga a um bretão, piemontês ou aragonês que a língua dele é, respectivamente, o francês, o italiano e o espanhol; talvez ele se ofenda.
Diacronismo? E obsoleto!?
O Houaiss na certa não consultou as gramáticas e os livros didáticos com que fui educado. E isso pelos idos de 1980 e 1990.
Obrigado, Paulo Araújo. Polido, como sempre.
Há pouco, por lapso, não coloquei o R.A. no comentário que saiu anónimo.
O Houaiss que consulto é o CD de junho de 2009, o qual, em "sentença" só tem 8 aceções:
1 frase lapidar que encerra um pensamento de ordem geral e de valor moral; provérbio, máxima
2 a decisão, a resolução ou a solução dada por uma autoridade a toda e qualquer questão submetida à sua jurisdição
3 Derivação: por extensão de sentido. decisão ou resolução tomada por qualquer pessoa
4 julgamento de Deus sobre os homens
5 Derivação: sentido figurado. frase que encerra uma decisão inabalável
6 Rubrica: gramática. Diacronismo: obsoleto. m.q. oração
7 Rubrica: gramática. Diacronismo: obsoleto. m.q. frase
8 Rubrica: lógica. qualquer sentença declarativa, independente da consideração de veracidade ou falsidade; proposição
Suponho que por lapso «celtíbero» esteja por «celtibero», e «Iberia» por «Ibéria»...
*
Quanto ao mais, já Camões, aludindo a Vénus e à língua portuguesa (cito de memória), «na qual quando imagina, com pouca corrupção crê que é latina».
Se hoje Vénus ainda imaginasse no português, com pouca corrupção cria que era inglês...
- Montexto
Usei (e sempre uso) o que agora se passa a chamar de Grande Houais, por enquanto a reimpressão de 2004, também na versão eletrônica 2.0:
<>; e em <>
O Houaiss eletrônico apresenta alguns problemas. Por exemplo: quando falávamos de "gama", fui consultá-lo e percebi que um dado modo de exibição só trazia a acepção 1; mudando para o modo tradicional, que simula o dicionário em papel, aparecia toda a definição do verbete. Talvez isso possa ter acontecido com "sentença". É uma sugestão. (Pode inclusive conferir o problema de "gama"; talvez eu carecesse de atualização...).
Não foi esse o problema, tanto que transcrevi 'sentença' e 'proposição' da versão eletrônica 2.0, mas, mais uma vez, meu cortar-colar saiu com defeito.
O que ocorre com 'sentença' é que as acepções das duas versões são diferentes; são oito no 2009 e 10 no 2010.
Quanto a celtibero e Ibéria, erro de dedo, sem dúvida.
Quanto a 'gama' no Houaiss 2009, eletrônico, são 7 acepções na entrada ¹gama, iguais em qualquer modo de exibição; mas ainda existem ²gama, ³gama e 4gama.
Paulo, isso lá depende da versão, suponho. Uso a antiquíssima 1.0, anterior - com certeza - a 2009, e nunca a atualizei. Todos sabemos que programas eletrônicos sempre saem com "bugs", e que posteriomente se publicam os "patches" para os corrigir.
E é precisamente isso que pretendo fazer em breve, pois sempre uso o tal modo por padrão e já começo a me questionar em quantos outros casos não terei ficado com a definição pela metade...
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