19.2.11

Estrangeirismos

Com humanismo

      Jorge Fiel entrevistou o director-geral da Servilusa (abrenúncio!), António Balha e Melo. Ora vejam o atendimento: «Após a recepção da chamada no call center, é mobilizado um dos 36 técnicos comerciais, que fardado de fato cinzento, pin da Servilusa na lapela, camisa branca, gravata verde-alface, se desloca ao local do óbito num Ford Focus castanho. Mostra à família o catálogo que leva no portátil e aconselha nas opções. Assinado o contrato, é logo digitalizado e enviado por e-mail para o coordenador do serviço, que destaca uma assistente com formação em Humanísticas para tomar conta da operação até ao fim» («“Ninguém morre duas vezes”», Jorge Fiel, «DN Gente»/Diário de Notícias, 19.02.2011, p. 104).
      Aquilo da assistente com formação em Humanísticas é que me deixou, já não digo de pé atrás, porque nestes casos vão os dois ao mesmo tempo, mas intrigado. Como a seguir se lê que «dignidade, respeito e humanismo são o mantra do director-geral da Servilusa», temo que haja aqui confusão. Quanto a Jorge Fiel, que começou por ser revisor no Jornal de Notícias, não teve artes de evitar os estrangeirismos call center, pin e e-mail. No perfil que traçou de António Balha e Melo, porém, teve o bom senso de escrever que o entrevistado, «aos 49 anos, aceitou o desafio de um caçador de cabeças (Rafael Mora) para tentar salvar da morte a Servilusa». Vá lá, evitou o barbarismo headhunter.

[Post 4459]

7 comentários:

Rita Maria disse...

Neste caso a confusão entre o jornalismo e as relações públicas parece-me ainda mais triste que o recurso recorrente ao neologismo...

Bic Laranja disse...

As Humanísticas serem servidas em cursozecos de formação profissional não admira. É uma evolução muito realística desde que foram uma temática com certa problemática no tempo do (meu) secundário.
Quanto ao director dos cangalheiros (que rico termo, este), pela conversa tem com certeza formação em Relações Públicas (fato e gravata), em Proactividades (ciência dos pins), em Colo-Cêntaros e deve ser muito versado no Auto-Hoje, o novo catálogo das cangalhas... (Como notou, todos os nomes das disciplinas - também há já quem diga módulos - do saber vão em maiúscula; para as elevar à devida categoria de ciência).
Dantes estas os cangalheiros eram gente mais sisuda; lembro-me do Godinho, a ordenança do comandante do quartel, que a primeira coisa que fazia ao jornal não era entregá-lo, era abrir solenemente a página da necrologia.
Cumpts.

Helder Guégués disse...

Na edição de quinta-feira do Diário de Notícias, Jorge Fiel escreveu que não se considerava «uma puta da escrita». A Rita está a desmenti-lo?

Bic Laranja disse...

"Dantes os cangalheiros", digo.

Paulo Araujo disse...

Gostei do abrenúncio!; não conhecia, parece Gil Vicente; e é (1502). Faz bom contraste com call center, pin e e-mail (arre!, também Gil Vicente).

Rita Maria disse...

Eu não desminto ninguém - não digo que ele se venda, nem ele nem a maioria dos nossos jornalistas. Pelo contrário, acho que são muito dados.

Anónimo disse...

Decididamente, temos mulher!
- Mont.