25.3.11

Como se escreve nos jornais

Má escolha

      «As portas da sala de audiências fecharam-se aos mirones e à imprensa, uma vez que a juíza presidente, Flávia Macedo, considerou ser necessário proteger a identidade das 16 jovens que terão sido abusadas, sequestradas ou roubadas pelo suspeito. Das 16 vítimas, duas ainda são menores de idade» («“Violador de Telheiras” confessa crimes e diz-se arrependido», José Bento Amaro, Público, 25.03.2011, p. 16).
      Se consultarmos um dicionário, vemos que «mirone» tem como sinónimos «espectador» e «observador», «aquele que vê». Mas não é um qualquer espectador: é alguém que vê e, mais particularmente, alguém que olha demasiado ou com curiosidade. Tem sempre — e talvez nenhum dicionário transmita exactamente a ideia — um certo sentido depreciativo. Ora, o público que assiste às audiências dos tribunais (que são sempre públicas, salvo quando a lei ou o tribunal determinar que se façam sem publicidade), independentemente de quem se trate, estão, no fundo, a velar pela justiça e pela democracia, pelo que não me parece bem que se diga que são mirones.

[Post 4613]

3 comentários:

Anónimo disse...

Exactamente.
Eu acrescentaria que os «mirones» espanhóis, passando a raia, ficam «mirões». E, quanto ao modismo «jovens que terão sido abusados», não há muito que foi censurado, e bem, no programa Páginas de Português, da Antena 2, e certamente também no Ciberdúvidas.
— Montexto

Eduardo disse...

Pessoalmente, associo sempre a «mirone» uma certa dose de «voyeurismo» (perdoe-se-me o francesismo) e curiosidade mórbida. Era assim que, na Póvoa de Varzim, designávamos aqueles que se entretinham a espreitar os casalinhos em plena... actividade...

O facto de o episódio decorrer num tribunal, não obsta a que um bom número de (candidatos a) assistentes estivesse muito pouco interessada na justiça e nas subtilezas do processo penal, preferindo deleitar-se com os pormenores sórdidos do caso, de preferência com o sofrimento e humilhação de vítimas e familiares.

Deste ponto de vista, talvez se justifique a designação de «mirones».

Anónimo disse...

O que custa a engolir é a expressão «aos mirones e à imprensa»; o jornalista pretende separar as pessoas presentes apenas em dois grupos: os segundos, que lá estão a fazer o seu árduo trabalho (ele próprio incluído), e os primeiros, que só atrapalham.