7.4.11

Como se fala na rádio

Caramba!

      Ser um faz mesuras: «Na prática, fazer mesuras corresponde a medir-se, no sentido figurado, claro está, com a pessoa a quem se presta a cortesia, a vénia ou a homenagem, sendo que dessa medição resulta o evidenciar da posição hierárquica de quem recebe as mesuras faça quem as faz» (Mafalda Lopes da Costa, Lugares Comuns, Antena 1, 7.04.2011).
      «Faça quem as faz»?! A jornalista/locutora havia de querer dizer «faça-as quem as fizer», mas saiu esta redacção assaz estranha e sem sentido. A propósito, a locução quem quer que exige verbo no conjuntivo? Mas o povo diz (ou dizia, quando havia povo): Quem quer que é, a seu pai parece. Não é apenas no rifoneiro que encontramos o conjuntivo, mas também na obra de Camilo, por exemplo. («Rifoneiro», mais um termo na fila para entrar no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.)

[Post 4667]

6 comentários:

Anónimo disse...

O bom povo é sereno, e nunca se engana, salvo erro.
— Montexto

Anónimo disse...

COMO SE FALA NA TELEVISÃO
Acabo agora mesmo de ouvir o orador Marques Mendes a dizer na TVI 24 que Rui Pedro Soares, o tal que explicou tudo tintim por tintim na Assembleia da República (cf. crónica de Alberto Gonçalves em linha: «Rui Pedro Soares explica tudo») «empochou» não sei quanto dele... Bons tempos! Isto agora quem não «empochou», «empochasse»...
— Montexto

Helder Guégués disse...

Sobre esse barbarismo, vejam aqui.

Anónimo disse...

Mas indo à questão:
«Mas o povo diz (ou dizia, quando havia povo): Quem quer que é, a seu pai parece. Não é apenas no rifoneiro que encontramos o conjuntivo, mas também na obra de Camilo, por exemplo.»
Não quereria antes dizer, Helder: «Não é apenas no rifoneiro que encontramos o indicativo, mas também na obra de Camilo, por exemplo»?
Porque nestes casos o conjuntivo encontramo-lo em toda a parte, e não só no povo e em Camilo. O que é mais raro é, sim, o uso do indicativo com as expressões «quem quer que», «como quer que», «o que quer que», «onde quer que», etc., mas que realmente se vai encontrando no rifoneiro e no povo, e em Camilo, mas também noutros.
«Tinha o que quer que era de gracioso», etc.
O giro não deve ter escapado ao olho clínico do grande, exímio e inolvidável Epifânio Augusto da Silva Dias, «um dos meus heróis»... Bastará verificar.
— Montexto

Anónimo disse...

Cá está (de um relance rapidíssimo à Sintaxe Histórica Portuguesa, mas há-de haver mais referências):
• «§ 273. b) Têm o verbo no indicativo ou no conjuntivo as orações causais de “como” e “como quer que”: “Como [os dois discípulos] tinham livre a vista, viam a Cristo: como tinham presa a advertência, não conheciam que era ele” (Vieira, I, 642).»
• «§ 386. 1) “Como” (também “como quer que”) é destas conjunções e loc. conjuncionais a que tem significação mais vaga: “Como quer que neste tempo os mouros de Calicut tinham trato em Quiloa” (Castanheda, 1, 19).»
*
Onde também se podia ter optado por:
• Como os dois discípulos tivessem livre a vista, viam a Cristo: como tivessem presa a advertência, não conheciam que era ele.
• Como quer que neste tempo os mouros de Calicut tivessem trato em Quiloa.
*
Mas uma das tendências psicológicas do falante é preferir o indicativo ao conjuntivo, o imperfeito (do indic.) ao condicional, e o presente ao futuro: cuidei que estavas (estivesses) lá; gostava (gostaria) de o ler se o encontrasse; devias (deverias) ler a Sintaxe Histórica Portuguesa; amanhã vou (irei) ao teatro; etc., etc., etc. Exemplos a flux na fala quotidiana de toda a gente e nos bons autores.
— Mont.

Anónimo disse...

«Conta Goethe na 1.ª parte da tragédia Fausto que este indivíduo, como quer que estivesse cismando no seu gabinete, abriu do livro de Nostradamus, viu o sinal do “Espírito da Terra”, entrou a berrar que se sentia a arder “como se estivesse embriagado de vinho novo”. E, depois, tais coisas disse que é um pasmar-se a gente!» (Memórias de Camilo, extraídas das suas obras por Joaquim Ferreira, Editorial Domingos Barreira, Porto, 1965, p. 321, n.º 4.)
— Montexto