«“Catrefada” vem de “catrefa”, que por sua vez é uma corruptela, ou seja, uma derivação da palavra “caterva”» (Lugares Comuns, Mafalda Lopes da Costa, Antena 1, 10.05.2011).
Corruptela, corruptela... Sim, «catrefa» é corruptela de «caterva», como «pulmonia», que se ouve um pouco por todo o País, é corruptela de «pneumonia». (E quando terá corruptela passado a designar a palavra que por abuso se escreve ou se pronuncia erradamente? Terá sido no século XIX?) Contudo, derivação aqui não designa o processo de formação de palavras, pelo que seria de evitar neste contexto linguístico. De resto, as corruptelas são assunto fascinante, e estão para a norma linguística como o organismo teratológico está para a conformação biológica normal. Mas há corruptelas e corruptelas, pois algumas nada têm que contrarie a norma num sentido sincrónico. Torres Vedras, por exemplo, é corruptela de Turres Veteres, expressão da baixa latinidade para Torres Velhas. E a Pontevedra dos Galegos (não é assim, Fernando?) era uma simples Ponte Velha. «Vedro», arcaísmo, foi adjectivo usado durante muito tempo na língua portuguesa.
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8 comentários:
O nome das terras: o nome... Ocorreram-me agora os de Vilar de Ossos e Oliveira do Hospital.
— Montexto
Exacto, Helder. «Vedro» é um adjectivo galego-português medieval. Não sobreviveu a 1400.
Lê-se em Francisco Manuel de Melo, em texto de 1637: «Alguns forão de parecer, que Teucro, Capitão Grego, dos que sobejârão da guerra Troyana, fundasse a cidade de Elenes: a qual, segundo a doutrina de Florião do Campo, parece ser Pontevèdra, o que se confirma com parte de seu nome; porque vedra, no vulgar de nossa lingua (entam comû a Portuguezes, e Gallegos) val o mesmo que vetera, na latinidade.»
De passagem, sublinho este testemunho - antigo e (na rotundidade da asserção) raro - da unidade medieval de galego e português.
Em matéria de corruptelas populares, anoto uma particularmente curiosa: amorródias (hemorróides).
Cuido ouvir al...
Cumpts.
E Ponte Vedra (p. 43) pelos galegos enquanto, lampeiros, dão autorizados bitaites sobre a recta grafia do português. Não terão o gallego com que se entreter e o castelhano como que se haver?
Cumpts.
Bic,
Tem razão: «almorróidas» é o belo achado.
Na outra matéria também tem razão. O extremismo lusista galego teve sempre destas coisas. Mas posso informá-lo da escassíssima representatividade dessa classe de galegos. De resto, o seu autodecantado contributo para o AO86 e A090 é simbólico. Conseguiram introduzir no texto do Acordo «brêtema» (nevoeiro) e «lôstrego» (relâmpago). Voilà!
A questão (ou o problema, se não a tragédia) do galego é de outra ordem, como sabe. Mas os extremistas existem para empatar.
<< vedros adjetivo
Atual: vedro
ano 1390, VERE, 29.18
[...] Erom homeens vedros do dito mester de curtir [...].
VERE = VEREAÇOENS: anos de 1390-1395. Comentário e notas de A. de Magalhães Basto. Porto: Câmara Municipal do Porto, [193-?]. [Citam-se, nas transcrições, os números da página e da linha.]>>
Este é o último registro datado ao ano, encontrado por A. G. Cunha para seu 'Vocabulário histórico-cronológico do Português Medieval'.
«Les extrêmes me touchent» (Gide).
— Montexto
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