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11.5.11

«Idêntico/semelhante»

Passo

      «“Sabíamos que o Tarbossaurus adulto era muito idêntico ao T. rex”, explicou por seu turno o coordenador do estudo Takanobu Tsuihiji, do Museu Nacional da Natureza, em Tóquio» («Tiranossauros adultos não competiam com jovens», Filomena Naves, Diário de Notícias, 10.05.2011, p. 32). Takanobu Tsuihiji disse: «We knew that adult Tarbosaurus were a lot like T. rex
      Já aqui o perguntei uma vez: a identidade tem graus? Se temos o vocábulo «semelhante», porque havemos de usar sem propriedade o vocábulo «idêntico»? Alguém imagina Camilo a escrever assim? (Risos) Talvez José Régio (aventa um): «Não se teria mostrado simplesmente incompreensivo, orgulhoso, estreito, agindo por força dum preconceito muito idêntico a tantos que lhe repugnavam?» (As Raízes do Futuro, José Régio. Porto:  Brasília Editora, 1982, p. 151).

[Post 4769]

10.5.11

Sobre «corruptela»

De Torres Vedras a pulmonia


      «“Catrefada” vem de “catrefa”, que por sua vez é uma corruptela, ou seja, uma derivação da palavra “caterva”» (Lugares Comuns, Mafalda Lopes da Costa, Antena 1, 10.05.2011).
      Corruptela, corruptela... Sim, «catrefa» é corruptela de «caterva», como «pulmonia», que se ouve um pouco por todo o País, é corruptela de «pneumonia». (E quando terá corruptela passado a designar a palavra que por abuso se escreve ou se pronuncia erradamente? Terá sido no século XIX?) Contudo, derivação aqui não designa o processo de formação de palavras, pelo que seria de evitar neste contexto linguístico. De resto, as corruptelas são assunto fascinante, e estão para a norma linguística como o organismo teratológico está para a conformação biológica normal. Mas há corruptelas e corruptelas, pois algumas nada têm que contrarie a norma num sentido sincrónico. Torres Vedras, por exemplo, é corruptela de Turres Veteres, expressão da baixa latinidade para Torres Velhas. E a Pontevedra dos Galegos (não é assim, Fernando?) era uma simples Ponte Velha. «Vedro», arcaísmo, foi adjectivo usado durante muito tempo na língua portuguesa.

[Post 4766]

22.4.11

«Embaixadora/embaixatriz»

É a crise

      «O Ministério dos Negócios Estrangeiros suspendeu desde janeiro o pagamento de complementos de reforma a viúvas de ex-embaixadores e antigos funcionários. Em resultado, cerca de vinte ex-embaixatrizes — a quem era reconhecido um trabalho de utilidade pública — ficaram reduzidas a pensões de sobrevivência de valor muito escasso, que em alguns casos não alcançam mais de 70 euros» («MNE suspende pensão a viúvas de embaixadores», Expresso, 16.04.2011, p. 48).
      Já é pacífico que houve especialização de sentido, e que embaixatriz é apenas a esposa de embaixador? E já viram a definição de «embaixador» no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa? Ei-la: «Representante do chefe de um Estado numa corte estrangeira.» E na Sexta-Feira Santa não trabalham, claro.
      «Só quem ha tratado com exemplares da especie pode avaliar a dose de impafia que incha o peito constellado da farda de um embaixador de carreira. Não ha na creação animal mais vaidoso... a não ser uma embaixatriz» (Cousas Diplomaticas, Oliveira Lima. Lisboa: A Editora, 1908, p. 259).

[Post 4714]



16.4.11

Sobre «gongórico»

É vezo entre nós

      «Talvez por esses seguidores não terem as qualidades do poeta original, ou talvez porque a poesia de Luis de Góngora fosse de difícil acesso e decifração para o comum dos mortais, a verdade é que do nome do poeta viria a nascer a expressão pejorativa “ser gongórico” como sinónimo de alguém que usa uma linguagem demasiado rebuscada, ridícula porque excessiva nos floreados» (Mafalda Lopes da Costa, Lugares Comuns, Antena 1, 14.04.2011).
      Primeiro e principal: desde quando é que existe a expressão «ser gongórico»? Valha-nos Deus. É quase cada sacholada, sua minhoca... Segundo: não é em todos os dicionários que o falante colhe que é vocábulo pejorativo. É ou pode ser. Do Dicionário Priberam da Língua Portuguesa e do Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora não se retira esse sentido. Mas sabemos que sim, é verdade. Ou, repito, pode ser. No Dicionário Brasileiro de Insultos, de Altair J. Aranha (Rio de Janeiro: Ateliê Editorial, 2002, p. 170), lê-se isto: «Dizer que alguém é gongórico indica que ele fala muito e diz pouco, que tem mais enfeite do que conteúdo.» De determinada escrita, afirmou Afrânio Coutinho: «Ela não é má porque é gongórica, como é vezo entre nós julgá-la, mas porque é de mau gongorismo» (Do Barroco. Rio de Janeiro: UFRJ, 1994, p. 175).
      Não sei se se interessam por estas miuçalhas da língua, mas algo surpreendente é que logo em 1624 se tenha cunhado no castelhano o termo culterano (registada nos nossos dicionários mas não explicada) para classificar o estilo gongórico, que é um trocadilho com «luterano». Foi nesta altura que Quevedo e outros escreveram que a poesia de Góngora só era clara quando era queimada, em alusão à heresia poética deste e, possivelmente, e de forma ínvia, ao facto de Góngora ser judeu. Vejo que a Enciclopédia Portuguesa e Brasileira acolhe o verbo agongorar: «Tornar semelhante ao estilo gongórico: para chamar a atenção do público, resolveu agongorar a prosa

[Post 4693]



6.4.11

«Salto/tacão»

Sondagem

      Os dois rapazes estavam sentados a «bater com os saltos dos ténis contra a parte de baixo de um banco». Não é, propriamente, um problema de tradução, porque heel («heels of their sneakers») tanto se pode verter por «salto» como por «tacão». Primeira pergunta: «tacão» é mesmo «subtipo» de «salto», como se lê aqui? Segunda: «tacão» é regionalismo? Hum... Para o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, salto é a «parte do calçado que alteia o calcanhar»; tacão é o «salto do calçado». Sinónimos puros, então. O que me parece é que «salto» é o termo mais usado, mas com alguma preferência (?), que não associo a regionalismo, pelo uso de «tacão» se é referido a calçado de homem. Os meus leitores têm a mesma ideia?
      «Quando o táxi apareceu, a tia Ângela Margarida saiu batendo com os tacões no soalho, nos degraus, na calçada do jardim microclima, e no portão de ferro que gemia» (O Vento Assobiando nas Gruas, Lídia Jorge. Revisão de Filipe Rodrigues. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 5.ª ed., 2006, p. 167).

[Post 4657]

14.3.11

«Tsunami/maremoto»

Falha do Marquês de Pombal

      É digno dos tempos que se vivem, com a tecnologia de que se dispõe: no sábado, estranhava aqui que os dicionários, com excepção do Houaiss, não registassem o substantivo «camuflado». Hoje, segunda-feira, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa passou a acolhê-lo. Como adjectivo: «Mil. Diz-se de ou fardamento que pode ser usado para camuflagem em operações militares.» Como substantivo: «Peça de vestuário, geralmente em tons de verde e castanho, semelhante a esse fardamento militar.»
      Bem, mas não vim aqui ufanar-me de nada. Queria apenas reflectir sobre a necessidade de se usar «tsunami» em vez de «maremoto». «A zona de maior risco sísmico para Portugal está localizada a sul de Sagres, na denominada Falha do Marquês de Pombal, justamente porque foi ali que ocorreu o sismo de 1755, seguido de um maremoto, que hoje todos designamos como tsunami» (Gualter Ribeiro, Portugal em Directo, 14.03.2011). Tanto quanto pude pesquisar, ora se afirma categoricamente que são conceitos diferentes, ora que são sinónimos. D’Silvas Filho, que sugeriu a forma «sunâmi» (!), ouviu certa vez um sismólogo explicar (só não revelou o nome) a diferença entre tsunami e maremoto.

 [Post 4562]


1.12.10

«Leis extravagantes»

Que se afasta do habitual


      «Ou são obsoletas ou precisam de reforma: é este o diagnóstico em forma de livro feito a 112 leis que estão fora do Código Penal», lê-se no subtítulo da notícia «Leis extravagantes foram vistas à lupa por equipa de magistrados» (Diário de Notícias, 1.12.2010, p. 20). No corpo do artigo, nem sequer é aflorada a definição de lei extravagante. A jornalista Rute Coelho há-de pensar que o que diz o subtítulo é suficiente para o leitor médio não julgar que leis extravagantes são leis excêntricas. Aposto singelo contra dobrado como nem sequer a maioria dos colegas de redacção da jornalista conhece o conceito.

[Post 4150]

25.10.10

Estado da arte

Em estado de choque


      Saber é saber, mas, comparando com o conhecimento que um doutorando deve ter do que seja estado da arte, saber-se que Goethe tinha aversão a cães, ao tabaco e a pessoas que usassem óculos é completamente irrelevante. O cronograma mostrava as sete fases por que se desenvolve, ao longo de sete trimestres, a feitura da tese de doutoramento: 1. identificação da literatura relevante e estado da arte; 2. recolha de informação; 3. elaboração e execução do estudo empírico; 4. redacção do trabalho; 5. revisão do orientador; 6. correcção do trabalho realizado; 7. redacção da tese. A doutoranda pergunta-me no 5.º trimestre: «O que é isso do estado da arte?» Como é que um doutorando não sabe (não quis saber) que ao estado do conhecimento em determinada área se dá o nome de «estado da arte» ou «estado do conhecimento»? A pesquisa, o levantamento bibliográfico desse conhecimento é mesmo a parte mais importante de todo o trabalho científico, pois como se poderá ser original se não se sabe o que outros têm feito na mesma área?

[Post 4007]

8.9.10

Como se escreve nos jornais

Indocíveis


      No Correio da Manhã, continuam a ignorar que uma criança de 3 anos não é um bebé. Culpa dos jornalistas, dos editores e dos revisores: «Os feridos mais graves foram transportados para o Hospital de Mérida, incluindo uma mulher que viajava com dois netos, um bebé de três anos, que estava ontem a ser operado, e o seu irmão, de sete» («Acidente junto às obras do TGV», Paulo Madeira, Correio da Manhã, 7.09.2010, p. 34).
      As palavras não são só palavras, são conceitos. É lamentável que continuem a laborar num erro tão básico e risível. Vejam se retêm desta vez: bebé é a criança recém-nascida ou de poucos meses.

[Post 3852]

22.7.10

Léxico: «submersível»

Avance a Marinha


      «A Procuradoria Geral da República (PGR) anunciou ontem a abertura de um inquérito para apurar se a relação pessoal entre a procuradora-adjunta, Carla Dias, e José Felizardo, que foi perito no processo dos submarinos e é presidente da INTELI, prejudicou a investigação à compra dos submersíveis ao German Submarine Consortium (GSC)» («PGR investiga relações pessoais», António Sérgio Azenha, Correio da Manhã, 21.07.2010, p. 52).
      «Adjunto», já aqui o vimos, nunca se liga por hífen a outros elementos de locuções. (O hífen deve ter caído da primeira linha, de «Procuradoria-Geral».) Mas não é disso que quero agora falar. Nem daquela inconcebível pontuação depois de «procuradora adjunta». Antes sobre o vocábulo submersível. Talvez não passe de escusado galicismo, mas vejamos o que registam os dicionários.
       Se o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora o faz equivaler a «submarino» (tal como o Dicionário Houaiss, que acrescenta que é pouco usado), já o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa define assim «submersível»: «Espécie de torpedeiro que, em caso de necessidade, pode navegar submerso.» Em francês, por exemplo, sous-marin e submergible remetem para conceitos diferentes — e, pelo que posso ver, também em português. Logo, optar por um ou por outro vocábulo não é nunca uma questão estilística.

[Post 3714]

10.7.10

«Supertaxa» e «sobretaxa»

E então?


      «A sustentabilidade teórica das taxas progressivas não conduziu, contudo, à sua aplicação imediata. No Reino Unido, apenas no orçamento Lloyd George (1910/1911) as taxas progressivas, sob a forma de uma supertaxa e depois de uma sobretaxa, foram introduzidas, acabando com as taxas proporcionais até então vigentes.»
      Em termos linguísticos, os prefixos super- e sobre- equivalem-se, este deriva daquele. Do que pude apurar, Lloyd George introduziu a supertax no orçamento de 1909. Em 1929 (já o político galês tinha sido obrigado a demitir-se sete anos antes, na sequência do escândalo que foi ter-se descoberto que vendera títulos honoríficos aos benfeitores do seu Partido Liberal), esta supertax foi renomeada surtax. Os dicionários, naturalmente, não registam «supertaxa», precisamente pela mesma razão por que não registam, por exemplo, «superbom». Registam, sim, porque se autonomizou enquanto conceito, sobretaxa, a taxa adicional ou suplementar sobre algo já tributado. No texto que cito, será correcto falar-se de «supertaxa» e «sobretaxa»? Não dará a entender que são conceitos diferentes?

[Post 3679]

Léxico: «anverso»

Diferente mas errado


      «Contudo, o grau de complexidade da justiça na distribuição dos encargos tributários obriga-nos a proceder a uma separação, que sabemos ser discutível, entre o verso e o inverso da mesma moeda.» Nunca tinha lido tal: «verso e inverso da mesma moeda». Habitualmente, escreve-se «verso e reverso» ― mas (também) incorrectamente. Vejamos: verso é o lado oposto ao principal, e reverso também, são sinónimos. E inverso também é o lado oposto ao principal. Assim, tanto «verso e reverso» como em «verso e inverso», onde está a face principal? Não tem, querem ver. Ao verso opõe-se o anverso.

[Post 3678]

26.6.10

Sobre «hábito»

Mas nem sempre


      Nunca pensamos na palavra «hábito» como significando, não a indumentária de um religioso (ou religiosa), mas a insígnia, o distintivo de uma ordem religiosa ou militar — ou religiosa militar, como a de Calatrava, por exemplo, a mais antiga em Espanha, cujos cavaleiros tomaram entre nós o nome de freires de Évora, e depois freires de Aviz. E em espanhol também o vocábulo hábito tem esta acepção. O hábito dos cavaleiros de Calatrava era uma cruz régia floreada.

[Post 3629]

24.6.10

Sobre «enviesamento»

Pense nisso


      «No entanto, alguns investigadores mostraram-se cépticos e sugeriram que a oferta de comida por parte dos investigadores poderia ter alterado o comportamento dos animais. E a questão ficou em aberto. Até agora. No estudo que desenvolveu nos últimos dez anos nas florestas do Uganda, o grupo de investigadores coordenado pelo primatólogo John Mitani, da Universidade de Michigan, nos EUA, não utilizou comida para se aproximar dos animais, o que elimina essa hipótese de enviesamento» («Chimpanzés matam por território», Filomena Naves, Diário de Notícias, 23.06.2010, p. 23).
      Já aqui falámos deste enviesamento, tradução do inglês bias. Só pergunto uma coisa: assim, secamente, quantos leitores é que a jornalista pensa que compreenderão o termo? Para agravar, nem sequer aparece registado nos dicionários gerais.

[Post 3624]

19.6.10

Ascendência/descendência

Esta já é velha


      Susana Salvador entrevistou os Black Eyed Peas para a revista Notícias Magazine (6.06.2010, pp. 40-45). Uma das perguntas, era inevitável, era se «vão torcer por Portugal ou pelos EUA o Mundial». Respondeu Taboo, que na verdade se chama Jamie Gomez e é, ao que todas as fontes asseveram, méxico-americano: «Pelo México, por causa da minha descendência mexicana. O meu padrasto é do México e vai ao Mundial, por isso disse-me que eu tinha de torcer pela equipa.» Jornalistas e tradutores estão todos os dias a cair neste erro infeliz, e só por falta de reflexão. Aqui até era possível, mas, mesmo quando se trata de uma criança, falam da sua «descendência». Quanto a Taboo, coitado, também confunde um pouco as coisas. Mesmo que tenha amor (quase) filial ao padrasto, que é mexicano (nasceu em Morelia, capital do Michoacão), nunca poderá afirmar, sem mentir, que tem ascendência mexicana.

[Post 3598]

17.5.10

«Voos de e para estes destinos»?

É uma maneira de dizer


      Maria de São José, no noticiário das 13 horas na Antena 1: «A nuvem de cinzas vulcânicas causou hoje o cancelamento de 32 voos nos aeroportos de Lisboa, Faro e do Funchal. Os aeroportos ingleses e irlandeses tiveram que ser novamente encerrados, por isso os voos de e para estes destinos foram cancelados.»
      É uma forma prática de dizer, usada todos os dias. Mas vejamos. Como destino é o lugar para o qual alguém ou alguma coisa se dirige (e o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa está a precisar de dar outra redacção ao verbete), «voos para estes destinos» é o correcto, mas não «voos destes destinos», pois já estaremos a falar de partidas. Solução? Substituir pelo vocábulo «cidades»: «por isso os voos de e para estas cidades foram cancelados».

[Post 3465]

11.5.10

Concílio/consílio

Não para mim


      Cara Luísa Pinto: sempre vi «consílio» e não «concílio», e a explicação é simples: é o vocábulo que Camões usa na estância 20 do Canto I de Os Lusíadas: «Quando os Deuses no Olimpo luminoso,/Onde o governo está da humana gente,/Se juntam em consílio glorioso,/Sobre as cousas futuras do Oriente./Pisando o cristalino Céu fermoso,/Vêm pela Via Láctea juntamente,/Convocados, da parte de Tonante,/Pelo neto gentil do velho Atlante.» Assim, devemos identificar esse episódio como Consílio dos Deuses e não Concílio dos Deuses. Está nos dicionários: consílio é a «assembleia, reunião, comissão, conselho». Concílio sempre se reservou para denominar a reunião de autoridades da Igreja, convocada ou autorizada pelo papa, com o fim de tratar de assuntos relativos à fé, à moral e à disciplina. E, se há dicionários, como o Houaiss, que registam como acepção por extensão de sentido «conselho, assembleia, reunião», devemos evitar referi-la ao episódio da epopeia camoniana. É por isso que lamento que o «livro de apoio didáctico» Para uma Leitura de Os Lusíadas de Luís de Camões, de Silvério Benedito (Queluz de Baixo: Editorial Presença, 4.ª ed., 2008, p. 94), tenha vindo legitimar essa confusão, afirmando «Concílio (ou Consílio) dos deuses no Olimpo».

[Post 3440]

28.4.10

«Submetível»?

Nada obsta


      Aborrecível, abrangível, absorvível, aferível... existem? Sim, e estão regularmente formados, pois o sufixo –ível foi aplicado a verbos da 2.ª e da 3.ª conjugações. O «exemplário», como refere o Dicionário Houaiss, é muito rico, passa das quatro centenas. Esta é uma tarefa do dia-a-dia do revisor e do tradutor: averiguar se determinada palavra está bem formada e pode ser usada. Na revisão de uma dissertação que me está a ocupar há muitos dias, a autora usou «submetível», que nenhum dicionário regista e pouca gente usa. Por enquanto, é caso para dizer, pois nada o impede.
      Escrevi «dissertação», mas a autora (e a orientadora, vejo aqui nas anotações manuscritas) chama-lhe «tese». Ora, trata-se de um mestrado, e a legislação aplicável distingue entre «tese de doutoramento» e «dissertação de mestrado». Que nos pode dizer Fernando Ferreira sobre a distinção?

[Post 3396]

Arrendar e alugar, outra vez

Não me impressiona


      «Ainda hoje», comentou aqui o leitor Fernando Ferreira, «na rubrica Bom Português da RTP, a frase “Tenho uma casa para alugar” era considerada errada. No entanto, a verdade é que já muitos dicionários (Porto Editora, Priberam, etc.) consideram “alugar” como sinónimo de “arrendar”, e definem “aluguer” como um “contrato de locação de uma coisa móvel ou imóvel”. Tendo em conta os milhares de anúncios “Aluga-se” que particulares e agências imobiliárias têm espalhado pelo país em lojas, apartamentos e vivendas, penso que é esta a opção correcta, porque já não há maneira de voltar atrás. O que pensa o Helder?»
      Penso que devemos lutar responsavelmente por manter a distinção, como também o deveremos fazer em relação a mandato/mandado, réu/arguido, entre outras. É verdade, como eu próprio referi há quase três anos, que a distinção, consagrada no Art.º 1023.º do Código Civil, não serve as mudanças entretanto ocorridas na sociedade, mas a norma legal ainda não foi alterada. Deverão ser os dicionários, que acolhem e propagam tantos erros, a fazê-lo? Até porque os dicionários não viriam, neste caso, antecipar-se ou forçar uma alteração legislativa, nada de veleidades, mas antes consagrar, como o fazem, erradamente, em relação a outros conceitos, erros muitos comuns.

[Post 3395]

26.4.10

Conceitos

Não me arrependo


      Podemos arrepender-nos por faltas cometidas por terceiros? Podem os Alemães, por exemplo, estar arrependidos por Hitler ter mandado matar milhões de judeus? Há jornalistas do Público que pensam que sim: «O ministro dos Negócios Estrangeiros, David Miliband, declarou-se, segundo o seu gabinete, “horrorizado” e o embaixador britânico no Vaticano, Francis Campbell, encontrou-se com responsáveis da Santa Sé para apresentar as desculpas de Londres. Face ao incidente, segundo a edição on-line do Times, conselheiros do Papa estarão já arrependidos de o líder católico ter aceite o convite para visitar o país» («Gaffe obriga Londres a pedir desculpas ao Vaticano», João Manuel Rocha, Público, 26.4.2010, p. 14).
      Como as cerejas... Na Sic Notícias, Ana Lourenço, quando se despede dos entrevistados, agradece sempre com um «obrigada por ter aceitado», e se se engana corrige. Mário Crespo diz sempre «ter aceite».

[Post 3390]