30.11.06

Verbo rever. Erros

Da Rússia, com ruído




      Antena 1, noticiário das 15 horas, José Milhazes: «Moscovo ‘tá, claro, a seguir atentamente todas as investigações que serão feitas pelas autoridades inglesas. E as autoridades russas ‘tão-se a dizer abertas a colaborar de todas as formas para que se deixe de pensar que a morte de Litvinenko [Александра Литвиненко] tenha sido obra dos serviços secretos russos ou por ordem das autoridades russas.» Nem quero falar da deselegância do «’tá-se» e «’tão-se», vou directamente ao rebuscado «[es]tão a dizer abertas». Uma forma menos tortuosa e mais elegante seria, por exemplo, «dizem-se abertas» ou «declaram-se abertas».
      Embora fale demasiado depressa, a dicção de José Milhazes não é das piores, convenho, mas desta vez, com o frio que está na Rússia, talvez tivesse a língua entaramelada. Por exemplo, a forma verbal «serão» é, mesmo depois de ter ouvido dez vezes a gravação, meramente hipotética. Se se tratasse de Evgueny Mouravitch, não tínhamos de nos mostrar tão exigentes, mas sendo um português, jornalista, não podemos — e o elidido «nós» não é um plural majestático, somos mesmo todos nós, ouvintes — fingir que está tudo bem. Com tudo o que de lábil a oralidade tem, é claro que o grau de exigência é diferente do que teríamos em relação à escrita, mas ainda assim há limites. E, a propósito, acabei de saber que, no início desta semana, um escritor, no lançamento de mais um livro, agradeceu enfaticamente a alguém que «reveu o texto». Este sim é um erro grave, imperdoável num escritor. Não é um lapsus linguae, é ignorância.