15.5.07

Tradução: «carotte»

Imagem: http://www.dt.insu.cnrs.fr/carottier/

A importância das cenouras


      O texto tinha como título «La mémoire de la glace» e dizia: «Dans les échantillons de glace (carottes) prélevés par les chercheurs se trouvent conservées les traces de l’histoire climatique de la planète : périodes de réchauffement, de refroidissement, teneur en gaz carbonique, en oxygène, etc. L’Antarctique est ainsi un gigantesque laboratoire pour étudier l’évolution des climats, et pour comprendre, et peut-être prévenir, les conséquences des pollutions atmosphériques causées par les pays industrialisés.» O tradutor — e que Deus lhe valha! — verteu assim: «Nas amostras de gelo («cenouras») recolhidas pelos investigadores encontram-se conservados vestígios da história climática do planeta: períodos de aquecimento, de arrefecimento, nível de dióxido de carbono, de oxigénio, etc. A Antárctida é assim um gigantesco laboratório para estudar a evolução dos climas e para compreender, e talvez prevenir, as consequências das poluições atmosféricas causadas pelos países industrializados.» «Cenouras»? Nem com aspas as engolimos. Mas sim, podia ser, pois «les carottes, naguère mal protégées, s’érodaient à la remontée et prenaient une forme légèrement conique : d’où la similitude avec la racine et le nom» (in Le Trésor de la Langue Française Informatisée). Mas em francês, não em português. Qualquer dicionário bilingue — e o que cito é o Grande Dicionário Francês/Português, editado pela Bertrand — dirá: «carotte s. f. Massa de terra extraída pelos instrumentos de sondagem». Pois em português também é simples: carote. Sem ser engenheiro, conheço a palavra e o conceito há muitos anos. Em certas estruturas, extraem-se carotes de betão para análise. Dos fundos marinhos, extraem-se carotes de sedimento para análise.
      De vez em quando, fala-se da falta de maturidade, apesar das regras no acesso ao Centro de Estudos Judiciários, dos juízes. Contudo, não é só com estes profissionais (embora as decisões destes tenham repercussão na vida dos indivíduos e da sociedade em si) que nos devíamos preocupar. Um recém-licenciado que leu mal (ou mal leu) três livros e se põe a traduzir também é perigoso.

2 comentários:

Helena Velho disse...

Sabe que o problema não é só do senhor que lê mal ou mal lê, não sabe?
As editoras de baixa qualidade,que se permitem editar livros , especialmente clássicos e obrigatórios, a preços acessíveis enfermam de um grande mal:
Cativam gente nova( o que não deveria ser sinónimo de ignorância!)para, a troco de uns quaisquer euritos, fazerem traduções.O método é simples: o sujeito tem de prestar provas da sua capacidade e é-lhe enviado um texto para traduzir.O pobre dá o seu melhor( que nem sempre é suficiente!) e reenvia o texto já traduzido.Nunca mais recebe resposta e lá se perdeu mais uma oportunidade, honesta, de trabalhar e garantir o mínimo para sobreviver.
Mas, sabe o que acontece ao texto traduzido por este e tantos outros que se candidatam à árdua tarefa de tradutores?
Aqui é que o cenário se torna fabuloso:os textos são compilados e juntos forma uma obra! Traduzida por "n" pessoas diferentes, com capacidades diferentes, com estilos diferentes...e dá uma salgalhada de tradução, facto que deveria envergonhar quem a publica.Mas, "eles" não sentem essa vergonha-atingiram o objectivo de fornecer ao "povo" obras importantes vertidas para português a preços competitivos.
E isto não é minha invenção! Já me aconteceu e a editora( deveria chamar-se outra coisa qualquer)existe e está bem de saúde!

Helder Guégués disse...

Felizmente, há poucas editoras como essa que descreve. A maioria trabalha honestamente para proporcionar um produto final de qualidade ao leitor.