28.3.08

Léxico: «filopátrico»

Já tinham pensado nisto?

«De facto, as águias-imperiais têm tendência a instalar-se perto do local onde nasceram — ou seja, são animais filopátricos» («Águia-imperial regressa ao interior de Portugal», Inês Santinhos Gonçalves, Público/P2, 7.3.2008, p. 4). Duas coisas. Primeira: o vocábulo «filopátrico» não aparece registado em nenhum dicionário da língua portuguesa. Segunda: grafar com hífen as palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas é algo que já toda a imprensa faz — antecipando-se em anos ao que o Acordo Ortográfico de 1990 estipula. Mesmo as almas cândidas que estão contra o acordo o fazem. Sem terem consciência, decerto. Devem estribar-se, forneço-lhes o argumento, na analogia…
«Emprega-se o hífen nas palavras compostas que designam espécies botânicas e zoológicas, estejam ou não ligadas por preposição ou qualquer outro elemento: abóbora-menina, couve-flor, erva-doce, feijão-verde; benção-de-deus, erva-do-chá, ervilha-de-cheiro, fava-de-santo-inâcio, bem-me-quer (nome de planta que também se dá à margarida e ao malmequer); andorinha-grande, cobra-capelo, formiga-branca; andorinha-do-mar, cobra-d’água, lesma-de-conchinha; bem-te-vi (nome de um pássaro)» (Base XV (Do hífen em compostos, locuções e encadeamentos vocabulares), art. 3.º).
Sem acrimónia, agora: independentemente do valor deste acordo, faria sempre falta — na ausência de uma entidade pública competente que o faça no dia-a-dia, como sucede noutros países — um instrumento regulador destas questões do hífen. Pelo menos. Sim, uma coisa tão pequena… Só quem não lida, não luta, com a língua todos os dias é que pode subestimar a importância da questão. Lembram-se decerto da parte da entrevista de Evanildo Bechara ao jornal O Globo que aqui transcrevi: «A reforma estabelece 13 regras para utilização do hífen. É um avanço, já que hoje Portugal tem mais de quarenta regras e sub-regras. Mas isso ainda poderia ser resolvido com quatro ou cinco regrinhas muito simples, que tivessem como critério básico impedir pronúncias erradas.» Tantas e tão poucas. Na verdade, nesta matéria, o falante sente-se menos perdido com a complexidade do que com as lacunas.

Dois exemplos: «A praga de topillos, ratos-cegos-mediterrânicos que desde Julho assolam os campos de Castela e Leão, diminuiu 58 por cento, revelou ontem Sílvia Clemente, responsável de Agricultura do governo de Valhadolid. No combate aos roedores estão envolvidos especialistas da Alemanha, EUA, Reino Unido e França» («Praga de roedores em Castela diminuiu», Nuno Ribeiro, Público, 6.09.2007, p. 18).
«Todos os anos, quando chega Junho, o biólogo Jaime Ramos, de Coimbra, parte para as paradisíacas ilhas Seicheles, no Índico. Mas não vai de férias. Pelo contrário. É nessa altura do ano que se inicia a época reprodutiva das andorinhas-do-mar-róseas, cuja população o biólogo português estuda ali há dez anos» («Estudar andorinhas num paraíso tropical», Filomena Naves, Diário de Notícias, 12.1.2208, p. 42).

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