19.4.08

Acordo Ortográfico

Vão para casa estudar

Lembram-se de eu ter mandado um jornalista do Público ir estudar para casa? Desconfio agora que ele até estudou, mas pelos livros errados. Refiro-me, concretamente, apenas a um dos erros. Escrevia ele: «A generalidade dos topónimos mantêm a maiúscula, mas esta torna-se facultativa em nomes de ruas, praças, etc. Vai ser possível, portanto, escrever-se avenida dos aliados ou rua augusta.» Contrapunha eu: «Não é verdade. Pior: é ridículo. Consigna o texto do novo acordo na Base XIX, n.º 2, al. i): «Opcionalmente, em palavras usadas reverencialmente, aulicamente ou hierarquicamente, em início de versos, em categorizações de logradouros públicos: (rua ou Rua da Liberdade, largo ou Largo dos Leões), de templos (igreja ou Igreja do Bonfim, templo ou Templo do Apostolado Positivista), de edifícios (palácio ou Palácio da Cultura, edifício ou Edifício Azevedo Cunha).»
Vi ontem que a fonte pode ter sido o «guia acessível e de consulta rápida sobre as principais mudanças no acordo» publicado pela Texto Editores. A propósito do uso da maiúscula e minúscula, lê-se na página 12: «d) Logradouros públicos, templos ou edifícios. Avenida da Liberdade ou avenida da liberdade. Torre dos Clérigos ou torre dos clérigos.» Sim, trata-se da obra atual — O novo acordo ortográfico, da autoria Pedro Dinis Correia e João Malaca Casteleiro.
A não ser que os autores tenham uma versão secreta e expurgada de erros e gralhas do texto do Acordo Ortográfico de 1990, têm tanta razão como o jornalista do Público. Se este leu a obra daqueles, terão de ser os autores a pedir desculpa ao jornalista e a todos os leitores. E nisso não sou visto nem achado.
Já que estamos nisto, ainda pergunto: porque é que o título da referida obra começa com minúscula? A Base XIX (Das minúsculas e maiúsculas), n. º 1, al. c), do Acordo Ortográfico de 1990 determina: «Nos bibliónimos/bibliônimos (após o primeiro elemento, que é com maiúscula, os demais vocábulos podem ser escritos com minúscula, salvo nos nomes próprios nele contidos, tudo em grifo): O Senhor do paço de Ninães, O Senhor do paço de Ninães, Menino de engenho, Árvore e Tambor ou Árvore e Tambor.»
Por outro lado, e para acabar, acho ridículo que o próprio título já esteja em conformidade com as regras do novo acordo — que ainda não está em vigor. Parece que, aqui, não se preocupam com a economia das famílias. Marketing.
«Custa 4,41 euros. É barato», diziam ao meu lado, na FNAC do Alegro, duas senhoras manifestamente pouco familiarizadas com livros. Acabaram por comprar apenas um dicionário da língua portuguesa de pequeno formato. Dentre as várias edições, optaram por uma em função do peso.

4 comentários:

Ricardo disse...

Acho que as pessoas não sabem que o livro é o que vem no Acordo Ortográfico em forma de resumo infantil.
No texto da VISÃO aparece a mesma 'piada' da avenida da liberdade e a fonte é sempre o Atual. Eu também já lamentei que os jornalistas tenham consultado essa obra em vez do próprio acordo...

Helder Guégués disse...

Caro Ricardo
É lamentável que o oportunismo dê frutos destes. De qualquer modo, a preguiça dos jornalistas tem grandes culpas nestes equívocos e erros.

Anónimo disse...

É barato???

Trinta e duas páginas por 4,41 euros, com o corpo da letra em tamanho catorze ou dezasseis, enfim...

Já agora, a propósito de gralhas, sempre se podia dizer ao Portal da Língua Portuguesa ou à própria CPLP para terem algum cuidado com os sítios de onde "tiram" os seus documentos. É que o que lá está, tremas e tudo, ou Muniche, não foi propriamente o que saiu em Diário da República no ano longínquo de 1991.

Compreende-se porquê: é o documento que está linkado na Wikipédia...

Helder Guégués disse...

São os facilitismos da era digital. E a ambição de sempre.