1.1.10

Acordo Ortográfico

Falta de vigor


      Cara T. A., não é isso que o Acordo Ortográfico de 1990 estatui, mas sim e bem diferente: «É facultativo assinalar com acento agudo as formas verbais de pretérito perfeito do indicativo, do tipo amámos, louvámos, para as distinguir das correspondentes formas do presente do indicativo (amamos, louvamos), já que o timbre da vogal tónica/tônica é aberto naquele caso em certas variantes do português» (Base IX, «Da acentuação gráfica das palavras paroxítonas», n.º 4). Juntamente com a dupla grafia, a facultividade é a grande fraqueza deste acordo. Por mim, continuarei a marcar graficamente a diferença, que, deixe-me corrigi-la, na escrita era, no âmbito do Acordo Ortográfico de 1945, de regra.
      Quanto à questão de estar em vigor ou não, respondo-lhe: em termos técnico-legais (os únicos que interessam, objectar-me-á), está. Contudo, em termos práticos, não é assim, pois vigor é actividade, funcionamento.

[Post 2965]

12 comentários:

venancio disse...

«Juntamente com a dupla grafia, a facultividade é a grande fraqueza deste acordo.»

É impossível ser mais sucinto e mais claro.

Bom Ano, Helder.

Helder Guégués disse...

Obrigado, Fernando. Um bom ano também para si.
Abraço,
Helder

R.A. disse...

Sendo facultativo, pergunto: porque não opta por adotá-lo já neste seu fantástico blogue?
Eu já resolvi fazer a partir de hoje em tudo que escreva!
Bom ano novo!

venancio disse...

R.A.,

Não sei o que o Helder responderá. Mas, por mim, lembro-lhe que não é o Acordo que é facultativo (antes fosse!), mas as formas que ele consagra. Assim, você - a partir de hoje! - pode escrever tranquilamente, isto é, sem receio da mínima crítica:

«Ontem levamos os miúdos à praça, onde comprámos sempre, sim, onde compramos sempre. Começamos pela hortaliça, depois passámos ao peixe, mas acabamos por levar carne. E o dinheiro que gastamos naquilo? Uma pechincha».

ISTO é, pois, a facultatividade, que o Acordo estabelece como princípio. É uma caricatura, a minha historieta? Aguarde e verá pior.

Helder Guégués disse...

Pois respondo que não tardará muito, embora também diga, como António Emiliano, que neste momento ninguém sabe aplicar o acordo.

Paulo Araujo disse...

Este AO não é o último a ser celebrado, mas pode ser a última ponte para a ortografia, de fato unificada, que um dia virá,tenho certeza. Entendo a dupla grafia e a facultatividade como uma concessão que os donos da língua deram a nós, brasileiros. Vocês continuarão escrevendo 'louvámos' e nós 'louvamos'; não sei porque essa excessiva preocupação em Portugal. Estou certo de que, no próximo Acordo, os acentos serão extintos: o inglês e o italiano provam sua desnecessidade. Para mim, o hífen foi o único problema conduzido de forma confusa e que conseguiu piorar o que já era ruim. Por que 'água-de-colônia (colónia)' e 'água de cheiro'? Ambas são perfumadas e no Brasil são sinônimos... Justificaram pela tradição,quando unidade ortográfica é, necessariamente, a quebra da tradição. Aos 'rebeldes', sugiro seguir o conselho que Álvaro Ferreira de Vera dá na última frase de sua obra (que acaba de ser publicada aqui): aquelle que lhe parecer boa, sigaa; & aquelle, a que não, emmendea. Bem que eu gostaria, mas sou disciplinado e vou cumprir a lei.

Helder Guégués disse...

O hífen foi mais um problema mal resolvido, sem dúvida, e eu já aqui o tenho afirmado. E é pena, pois esta é sempre uma oportunidade rara. Quando teremos outro acordo? Na verdade, podia ser já amanhã, só para remendar o que ficou mal resolvido ou por resolver neste.

Paulo Araujo disse...

Concordo plenamente. Quanto aos acentos, esqueci de comentar que já tivemos uma língua portuguesa quase sem acentos, como está em Vera; e funcionava.

venancio disse...

Funciona?

«Que é que fabricas?» «Onde? Na fabrica?»

«Deixei-o na secretaria.» «Onde? Já procurei dentro da secretaria, fora da secretaria, em cima da secretaria, debaixo da secretaria... e nada».

[Esta não funciona para brasileiros, simplemente porque o OBJECTO «secretária» no Brasil se chama «escrivaninha»].

«Eu liquido os gajos!» «Liquido? Com gazes não ia melhor?»

Etc., etc. etc.

Em 1986, no JL, escrevi um texto corrido, absolutamente ilegível, sem acentos. Não sei se ajudou a matar o monstro do "Acordo" desse ano. Mas gosto de pensá-lo.

R.A. disse...

Caro venancio (sem acento!),
Compreendo a lição da sua historieta mas duvido da sua efetiva realidade. Só alguém muito volúvel mudará de critérios na mesma frase. Já o texto dos acentos me deixa mais preocupado: de facto, a ideia de deixar de usá-los, que me parecia boa, fica a tremer com medo. O meu argumento era que "medo" também não precisa de chapeuzinho, mas, aceito, se eu escrevesse "mudara", ali em cima, sem acento, isso não fazia sentido.
Obrigado.
Fiquei entusiasmado com o anúncio da próxima adesão do Assim Mesmo...

Paulo Araujo disse...

Acho que funcionaria, depois de um tempo, sem dúvida. Estamos conseguindo viver sem o trema, o que parecia impossível. Teme-se que daqui a pouco diremos 'frekente', pois já havia palavras em que se usavam as duas formas (liqüidação e liquidação).

Venâncio disse...

Caro R.A.,

O meu nick "venancio" é só isso, um nick. Mais: sou cidadão dum país que não admite o circunflexo no meu nome. Mas pronto: neste espaço virtual, sou um homem livre.

O nosso assunto: quando, em contexto de Acordo Ortográfico, se falou em eliminar acentos, isso implicava tão-só (e já era excessivo...) os acentos das proparaxítonas (fábrica, estômago, éramos, etc.). Portanto, "mudará" ficaria intocado. O mesmo valeria para todos os acentos de sílaba final.