18.4.10

Sobre «escada»

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      Como se sabe, usa-se indiferentemente escada ou escadas quando dizemos, por exemplo, «desci a escada»/«desci as escadas». Ontem de manhã, a minha filha, que tem 3 anos, contou-me um sonho (há seis meses que começou a contar-me os sonhos) que teve. Contou-mo três vezes seguidas. Como acontece muitas vezes, quis certificar-se de que a ouvira bem, pelo que tive de repetir, também eu, alguns trechos. «Sim, desceste as escadas, ias sozinha...» «“Escadas”, não; “escada”.» Com excepção do Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa, nenhum outro se refere ao uso do plural, que é corrente e está legitimado, ao que me parece, pela etimologia. Relacionada também com escada, há também uma expressão curiosamente elíptica, que algumas pessoas evitam. Ei-la: «Briony, por seu lado, subiu a escada a dois e dois, cheia de energia pelo seu sentimento do dever e de fazer bem, prestes a fazer uma surpresa que só lhe podia granjear elogios» (Expiação, Ian McEwan. Tradução de Maria do Carmo Figueira e revisão de Ana Isabel Silveira. Lisboa: Gradiva, 5.ª ed., 2008, p. 204). E já que derivei outra vez para esta obra, outra palavra relacionada: «Mostrou o bilhete e mergulhou naquela luminosidade amarela e suja até chegar às escadas-rolantes que começaram a transportá-la para baixo e a fazê-la mergulhar naquela brisa artificial que vinha da penumbra, da respiração de um milhão de londrinos, e que lhe refrescava o rosto e lhe fazia abanar a capa» (ibidem, idem, p. 393). Nenhum dicionário regista esta grafia com hífen, mas nem tradutora nem revisora quiseram saber destes pormenores.

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