O cronista do Público Pedro Lomba andou a viajar pela Holanda este Verão. E quem fala da Holanda não pode deixar de referir, não as tulipas, mas o sexo. Não na Holanda mas no Times, o cronista aprendeu, pela boca de um adolescente holandês, que «o sexo anal dói no princípio mas se persistirmos pode ser bastante agradável». O cronista também aproveitou para usar vocábulos raros, como intercurso: «As holandesas marcam na agenda os dias da semana em que têm intercurso com os maridos» («Repressão sexual», Pedro Lomba, Público, 14.9.2010, p. 44). Parece anglicismo disfarçado, sexual intercourse, não é? Mas não. Se o Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora o ignora, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa e o Dicionário Houaiss registam-no: «comunicação, trato; relacionamento». E este último dicionário exemplifica: «intercurso sexual».
[Post 3884]
6 comentários:
Acabo precimente de ler esse artigo, e também me chamou a atenção. Se bem me lembro, Gilberto Freyre, na «Casa Grande & Senzala», chama-lhe também «congresso», como se tivéssemos míngua de palavras para baptizar a coisa. Há-de vir tudo do inglês, para não variar, acabando por merecer o beneplácito de qualquer dicionário mais arteiro, logo seguido pelos seus congéneres, que não se resignam a prescindir de mais uma entrada, por espúria que seja, atestando com fidelidade o processo de «enriquecimento» de que a língua sai com uma mão atrás e outra à frente.
- Montexto
Fico intercorrido com estes cronistas de hímen permissivo.
Permita-me discordar. O termo "intercourse" em inglês tem um significado simples em português: "coito".
"Intercurso" existe certamente em português, mas a interpretação que lhe dão os dicionários - "comunicação, trato; relacionamento" ou até "intercurso sexual" - não são bem a mesma coisa.
Lomba estaria a traduzir do inglês "sexual intercourse"; no contexto, julgo que só "coito" seria apropriado.
Lomba também podia ter escrito "cópula" que não é feio. Ou então, "truca-truca" como disse Natália Correia...
Natália nunca diria "intercurso", certamente... ;-)
Já agora: é com hífen, não é?
Melhor, melhor — será «relações sexuais». Contudo, ainda agora não me parece que seja puro decalque do inglês. O leitor Paulo Araujo mandou-me a seguinte abonação retirada do Dicionário Aurélio: «Versátil no intercurso sexual, não desdenharia [D. Pedro I] as mulheres aparentemente menos dotadas» (Otávio Tarquínio de Sousa, A Vida de D. Pedro I, I, pp. 106-107).» A obra data de 1952, época ainda relativamente fechada à invasão de anglicismos. Sim, bem sei que o autor é brasileiro, mas ainda assim, julgo tratar-se meramente de uma forma idêntica de formular o conceito.
Não lhe dêem mais voltas: a coisa, de tão evidente, nem precisa de ser provada. Alguém imagina tal palavra na boca ou pena de Castilho, Garrett, Herculano, Camilo, Júlio Dinis, Ramalho, Antero, Junqueiro, Cesário, Nobre, Pessanha, Aquilino, até Pessoa, apesar de abeberado no inglês, ou Torga ou J. de Araújo Correia, ou, no Brasil, Machado de assis ou Graciliano Ramos, tudo gente conhecedora da sua língua, como dantes se exigia de quem se abalançava a publicar? Estou que a pergunta se responde por si.
- Montexto
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