Ando a reparar neste erro há muito tempo, mas acho que não pode passar de hoje alertar os meus leitores. Exemplifico com um excerto de um artigo jornalístico, mas tenho-o visto em inúmeros livros revistos. Agora mesmo, só me lembrei dele porque numa revisão me apareceu um to the point traduzido dessa forma. «O Aviso n.º 4/2009 obriga as instituições a prestar diversas informações numa ficha de informação normalizada num momento anterior ao do depósito e, para evitar as tão mal-afamadas “letras pequenas”, a entidade presidida por Vítor Constâncio vai ao ponto de definir que o tamanho da letra não poderá ser inferior a corpo 9» («Maior rigor nos depósitos bancários», Diogo Lopes Pereira, «DN Bolsa»/Diário de Notícias, 20.11.2009, p. 11).
É a ponto de que se escreve, e tem, segundo o Dicionário Houaiss, os seguintes valores: chegando mesmo a, chegando até a (Era agressivo a ponto de descompor publicamente a esposa.»); prestes a («Estava triste a ponto de chorar.»); usado como locução preposicional expletiva enfática, equivalente à preposição a («Chegou a ponto de desistir do seu curso.»).
[Post 3915]
4 comentários:
Peço desculpa (ao autor e ao Diconário Houaiss) de discordar, mas parece-me que é errado considerar errado dizer (ou escrever) "a entidade presidida por Vítor Constâncio vai ao ponto de definir que...": nesta acepção, "vai ao ponto de" equivale a "vai ao extremo de". "Estar a ponto de", e só com "estar" como regente, significa "estar quase a" mas "não chegar a".
Concordo com Francisco Agarez.
Construção similar é chegar ao descaramento de, mas há decerto outras.
O Ciberdúvidas ventila a questão na pergunta 15918: «A ponto de, ao ponto de», referindo que de 6 dicionários consultados só o «Dicionário Electrónico Houaiss» (2001) regista as duas grafias, considerando-as equivalentes, todos os outros registam só «a ponto de», algum com a variante «a ponto que» ou «a pontos que».
Com ressalva de melhor estudo e consulta de alguns autores, eu diria que com o auxiliar «estar» só se empregará «a ponto de», e significará «estar prestes a, estar quase a, estar a pique de (como escreve muitas vezes Machado de Assis), estar à beira de», portanto que se esteve na iminência de fazer, mas não se chegou a levar a cabo ou efeito (ou a pôr por obra, como diziam os clássicos), não passou a acto; e já com os verbos «chegar, ir» e equivalentes se empregará «ao ponto de» e também «a ponto de», mas com o sentido de que se ultrapassou o estádio de mera intenção para passar a realização e acto. Assim, as frases citadas «chegar ao descaramento de» e «ir ao ponto de definir» significarão que quem «chegou ao descaramento de» teve mesmo esse descaramento, não se limitou a concebê-lo e apetecê-lo, e quem «foi ao ponto de definir» definiu efectivamente, não se ficou pela intenção, vontade ou ganas de definir, como decerto ficaria se «estivesse a ponto de definir», sem passar ou ir mais além, isto é, sem passar ou ir ou chegar ao ponto de definir.
Enfim, «salva meliori»...
- Montexto
É bom saber-me em ilustre companhia.
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