24.10.10

Títulos, pós-títulos e entradas

Mais cuidado


      Merece reflexão — aos jornalistas, que os leitores sempre a fizeram — a falta de autonomia na redacção de títulos, pós-títulos e entradas das notícias. Complementares, sim, como lembra o provedor do Público, mas suficientemente autónomos para não serem disparates ridículos: «A redacção de títulos, pós-títulos e entradas das notícias obedece a regras técnicas inspiradas por valores como a relevância, a inteligibilidade, a eficácia informativa e a capacidade sugestiva. São normas que existem para garantir a qualidade das peças noticiosas. Uma que é por vezes esquecida é a que recomenda que esses elementos — que são lidos antes do próprio texto da notícia, e para alguns dispensam mesmo essa leitura — sejam complementares entre si, mas possam ser entendidos de forma autónoma. A compreensão do que se escreve numa entrada não deve depender do que se diz num título. Vêm estas considerações técnicas a propósito do comentário feito por um leitor à estranha entrada de uma notícia intitulada “Comissão Europeia quer proibir clonagem de animais” (página 13 da edição da passada quarta-feira). Essa entrada, que, na cabeça de quem a redigiu, estaria articulada com o título citado através, por exemplo, de uma subentendida conjunção adversativa, rezava assim: “A proposta de John Dalli, comissário responsável pela saúde e consumidores, prevê a autorização do consumo humano dos seus descendentes”. “Interessante”, comenta o leitor Ricardo Charters d’Azevedo, para quem “a mania de reduzir títulos, na pressão da saída do jornal, dá isto...”. Pretendia-se naturalmente explicar, como aliás decorre da notícia, que Dalli não vê inconvenientes no consumo humano da carne ou do leite dos bichos descendentes de animais clonados. Mas o que a entrada da notícia diz de facto, tal como foi publicada, é que há um comissário europeu que faz questão de ver canibalizada a sua própria e putativa prole. Uma revisão especialmente atenta às frases mais destacadas de cada página evitaria que um momento de desatenção se transformasse num contributo involuntário para uma antologia do disparate na escrita jornalística» («Humor negro involuntário», José Queirós, Público, 24.10.2010, p. 35).

[Post 4004]

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