O falso adjectivo
«É difícil ser-se positivo. Numa reportagem muito parva mas esclarecedora no New Yorker datado com o primeiro dia da Primavera (21.3.2011), Dana Goodyear conta a história de dois psicoterapeutas jungianos em Hollywood. Na primeira sessão, Barry Michels pede ao fiel cliente que feche os olhos e se concentre nas coisas que agradece. Se o doente nada disser, Michels, que cobra 360 dólares por sessão, sugere o cão do doente. Aí, o doente concorda que sim, que agradece o cão que tem. De seguida, se o cliente não quiser ir além do cão no rol das coisas pelas quais dá graças, Michels sugere o sol. Responde o relutante paciente (dois adjectivos armados em adjectivo e substantivo): “Sim, o sol, [...] agradeço o sol. Às vezes» («A metade invisível», Miguel Esteves Cardoso, Público, 16.03.2011, p. 39).
Percebemos por que motivo Miguel Esteves Cardoso afirma que são dois adjectivos — mas temos de lembrar aos leitores que, no caso, «paciente» é substantivo. Por outro lado, e isto é o principal (que nem sempre vem em primeiro lugar), se um está armado em adjectivo, não está armado em nada, pois que armar-se em é expressão idiomática que significa dar-se ares de; fingir-se; mostrar-se diferente do que se é para causar uma impressão favorável. (Esta acepção também não está registada no Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, esse queijo suíço armado em dicionário.)
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1 comentário:
Ou «meter-se a».
Mas tudo isso devia ser evidente para quem escreveu tantas «lições de português»... Enfim.
— Montexto
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