7.3.11

Pronúncia. Dissimilação

Afinal, é de mau gosto

      Comecemos por dizer, com Vasco Botelho de Amaral, que as disputas à volta da pronúncia são insensatas. E façamos como ele: falemos, mais uma vez, de pronúncia. No último Câmara Clara, com o tema «Gainsbourg e os outros franceses», uma das obras referidas foi Príncipes de Portugal, Suas Grandezas e Misérias, de Aquilino Ribeiro. Paula Moura Pinheiro, no que pode ter sido lapso, mas isso não interessa, pronunciou a palavra «príncipes» sem dissimilação. A pronúncia normal, como se sabe, é com dissimilação, tal como se faz com os vocábulos «vizinho», «ministro» e outros. Só refiro o caso porque ainda na semana que passou uma professora de Português me confessava que nunca tinha compreendido porque se havia de pronunciar dessa forma. Vou revelar-lhe um segredo, cara M.: não tem de pronunciar dessa forma. «Não quere isto dizer que os que pertençam a regiões, onde fique natural a manutenção dos ii, sejam obrigados à dissimilação. Apenas o que me parece especioso é, sob color de gôsto de sonoridade, cair-se no mau gôsto de ajanotar a fala quotidiana» (Meditações Críticas sobre a Língua Portuguesa, Vasco Botelho de Amaral. Lisboa: Edições Gama, 1945, p. 266).

[Post 4533]

6 comentários:

Venâncio disse...

Ok. Cá o Degas, posto em modo relaxado, diz «vezinho», «menistro», «príncepe». Como diz «Lejboa», «estud's» e assim. Acompanham-me nisto vizinhos, ministros e mesmo príncipes (ele há-os por aí), de Lisboa ou não, e até com estudos.

Mas (por especioso que pareça a alguns agir «sob color de gosto de sonoridade») a minha pronúncia cuidada procura preservar a sonoridade possível, num idioma que vai perdendo cor.

É que ele há, também, um desleixo snob. N'é?

Venâncio disse...

P.S.

Depois, há «discriminar» e «descriminar».

A propósito: deveria «discriminar» pronunciar-se d'scr'm'nar? Onde pára (ou não pára) este mutismo chique?

Anónimo disse...

«Procurar preservar a sonoridade possível, num idioma que vai perdendo cor», devia ser quase um imperativo nacional.
Quanto a «ministro», «vizinho», «Filipe» e que tais, sempre me ensinaram que estas vozes normalmente se pronunciam «menistro», «vezinho», «Felipe» (não se chegou a grafar «Felipe», como ainda agora em Espanha?). Também esta, para mim, é questão resolvida, que não tenciono repisar.
— Montexto

Venâncio disse...

Caro Montexto,

Que «imperativo nacional» levou a «ensinarem-lhe» a descolorir a pronúncia de vizinho, de ministro e outras?

Isto, pergunto-lho eu, que também fui «ensinado» a fazê-lo.

Anónimo disse...

«Pourquoi? On ne sait pas. Il n’est pas d’ailleurs dit que tout s’explique dans la vie» (Giono). Nem na língua, acrescento eu, como outros antes de mim, entre os quais Mário Barreto.
Mas isso deve perguntar a quem mo e, pelo visto, também lho ensinou. Eu sempre fui «bem ensinado», e sigo as lições; esquecê-las não é o meu forte. Em todo caso, uma das boas tendências da língua portuguesa é não ser pernóstica e espremidinha nem exigir boquinhas de quem a pronuncia com naturalidade.
— Montexto

R.A. disse...

Pois cá entre o Douro e o Minho nunca me ensinaram tal coisa. Será que, para sabermos se a Paula Moura Pinheiro (20 valores para o "Câmara Clara"!) está a ser pedante, ao pronunciar os ii, precisamos de saber se ela é mulher nortenha?