Superjuiz no Ticão
«Direcção-Geral ainda não terá pago um complemento ao magistrado por acumular o ‘ticão’ [Tribunal Central de Instrução Criminal] com a jurisdição militar» («Juiz sem parte do ordenado», C. R. L., Diário de Notícias, 14.03.2011, p. 28).
De uma tiçoada precisava o jornalista (e de duas o revisor): então só por ser grande, um aumentativo, deixa de ser nome próprio? Ticão escrevem, e escrevem bem, a revista Sábado e o i. Quando os meus olhos pousaram na palavra, pensei que tivesse caído a cedilha ao pedaço de lenha ou de carvão aceso ou meio queimado. Invulgar, aqui, é somente a adjunção do sufixo de sentido aumentativo a um acrónimo.
[Post 4561]
4 comentários:
T.I.C. por Tribunal Central de Instrução Criminal. Então o "Central" não conta? Se não for central continua a merecer aumentativo?
Nem há coerência nem sobriedade, para não dizer que nada disto tem pés nem cabeça.
Crioulo na forja, é o que é.
Cumpts.
Por ser «Central» é que merece o -ão.
Pois bem. Mas omite-se Central para dizer ão? Não quero contrariá-lo mas as tiçoadas são bem aplicadas mas curtas. O jornalista precisa é dum pampilho pelos lombos por ir tão desencabrestado.
Cumpts.
Sim, no mais (refiro-me ao «terá pago») já não valerá a pena partir uma lança contra os moinhos de maus ventos (se não ventosidades) que sopram contrários à língua portuguesa. Ainda assim, como a alma não é pequena, e as causas perdidas sempre nos foram simpáticas, diga-se ou lembre-se o seguinte: além do fechamento da pronúncia, porventura agravado ao diante com a eliminação de letras que contribuem para a sua relativamente maior abertura, já aqui lamentado, também lavra a tendência para preferir as formas irregulares e mais curtas dos particípios passados às regulares, inclusive nos tempos compostos da voz activa. Assim, ensinava-se, por exemplo, «tinha pagado, tinha gastado, tinha ganhado, tinha aceitado, tinha entregado», voz activa; mas «foi pago, foi gasto, foi ganho, foi aceite ou aceito ou aceita, foi entregue», voz passiva. Agora, porém, quase sempre, até na voz activa, «tinha gasto, tinha ganho, tinha aceite, tinha entregue». E a abusão vai ao extremo de se perpetrar o mesmo com os verbos «empregar» e «encarregar», apesar de só terem por particípio a forma regular «empregado, encarregado», forma que por isso deve integrar tanto a voz activa («tinha empregado, tinha encarregado») como a passiva («foi empregado, foi encarregado»). Em vez disso, agravada aqui a tal tendência pela falsa analogia com o verbo «entregar», grassam grossas e grosseiras as formas «foi empregue, foi encarregue». «O horror! O horror!» (Kurtz).
— Montexto
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