Histórias
Passei ontem, à pressa, pelo memorial à Matança da Páscoa, acabado de inaugurar no Largo de São Domingos. Muito digno e de elementar justiça. Do ponto de vista de um revisor, nem tudo está bem. Detectei um erro na legenda inscrita na semiesfera inclinada (a peça escultórica, da autoria de Graça Bachmann, de que mais gosto do conjunto), mas decerto com interesse apenas para revisores, pelo que hoje não digo mais nada. «Ó terra, não ocultes o meu sangue e não sufoques o meu clamor!» Citar Platão é um pouco mais complexo. Passem por lá, se puderem, e depois conversamos.
E ainda a propósito deste monumento, pode ler-se hoje no Público: «Pode dizer-se “Lisabona, Orasul Tolerantei”? A frase significa “Lisboa, Cidade da Tolerância” e, desde ontem, é uma das 34* com o mesmo significado, em outras tantas línguas, que se lêem num mural no Largo de São Domingos, na capital. Português, hebraico, árabe, creoulo, tétum ou mandarim são algumas das línguas inscritas para evocar o massacre que, em 1506, matou entre 2000 e 4000 judeus» («Memorial do massacre de judeus afirma tolerância de Lisboa», António Marujo, 23.4.2008, p. 8). Deveria ter escrito «crioulo». Apesar de o vocábulo ter origem controversa, a ortografia actual manda-o escrever com i. Com e, só o navio-escola, antes lugre bacalhoeiro, Creola.
Damos mais uns passinhos no texto e — zás! «A presidir, António Costa, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, D. José Policarpo, cardeal-patriarca de Lisboa, e Eliezer Shai Di Martino, rabino judaico.» E há rabinos que sejam muçulmanos ou católicos, acaso?
Damos mais uns passinhos e, ops!, lemos que «António Costa disse que, contra a “tentação dos negacionismos”, se deve a assumir a história “memória viva, crítica, activa e vigilante”, sublinhando o valor “simbólico” e “pedagógico” do memorial». O vocábulo «história» não merece uma maiúscula inicial, num jornal em que se escreve, por exemplo, a torto e a direito, «presidente» com maiúscula? Vejam lá isso. «Candidato da esquerda a Presidente paralisa Cidade do México» (Dulce Furtado, 1.08.2006, p. 19). A frase, de qualquer modo, não está muito escorreita.
* Fernanda Câncio também lá estava e escreve hoje no Diário de Notícias que serão «33 ou 34 (os dois designers responsáveis, Susana Figueiredo e Paulo Cardoso, não têm a certeza) línguas do mundo» («Três memoriais para um massacre sem memória», 23.4.2008).
Passei ontem, à pressa, pelo memorial à Matança da Páscoa, acabado de inaugurar no Largo de São Domingos. Muito digno e de elementar justiça. Do ponto de vista de um revisor, nem tudo está bem. Detectei um erro na legenda inscrita na semiesfera inclinada (a peça escultórica, da autoria de Graça Bachmann, de que mais gosto do conjunto), mas decerto com interesse apenas para revisores, pelo que hoje não digo mais nada. «Ó terra, não ocultes o meu sangue e não sufoques o meu clamor!» Citar Platão é um pouco mais complexo. Passem por lá, se puderem, e depois conversamos.
E ainda a propósito deste monumento, pode ler-se hoje no Público: «Pode dizer-se “Lisabona, Orasul Tolerantei”? A frase significa “Lisboa, Cidade da Tolerância” e, desde ontem, é uma das 34* com o mesmo significado, em outras tantas línguas, que se lêem num mural no Largo de São Domingos, na capital. Português, hebraico, árabe, creoulo, tétum ou mandarim são algumas das línguas inscritas para evocar o massacre que, em 1506, matou entre 2000 e 4000 judeus» («Memorial do massacre de judeus afirma tolerância de Lisboa», António Marujo, 23.4.2008, p. 8). Deveria ter escrito «crioulo». Apesar de o vocábulo ter origem controversa, a ortografia actual manda-o escrever com i. Com e, só o navio-escola, antes lugre bacalhoeiro, Creola.
Damos mais uns passinhos no texto e — zás! «A presidir, António Costa, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, D. José Policarpo, cardeal-patriarca de Lisboa, e Eliezer Shai Di Martino, rabino judaico.» E há rabinos que sejam muçulmanos ou católicos, acaso?
Damos mais uns passinhos e, ops!, lemos que «António Costa disse que, contra a “tentação dos negacionismos”, se deve a assumir a história “memória viva, crítica, activa e vigilante”, sublinhando o valor “simbólico” e “pedagógico” do memorial». O vocábulo «história» não merece uma maiúscula inicial, num jornal em que se escreve, por exemplo, a torto e a direito, «presidente» com maiúscula? Vejam lá isso. «Candidato da esquerda a Presidente paralisa Cidade do México» (Dulce Furtado, 1.08.2006, p. 19). A frase, de qualquer modo, não está muito escorreita.
* Fernanda Câncio também lá estava e escreve hoje no Diário de Notícias que serão «33 ou 34 (os dois designers responsáveis, Susana Figueiredo e Paulo Cardoso, não têm a certeza) línguas do mundo» («Três memoriais para um massacre sem memória», 23.4.2008).
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