«“Entra o Governo com um tropeção de Mariano Gago”. A tuiteira Catarina Pereira começava assim, às 10 da manhã, com a hashtag (etiqueta que permite pesquisar os tuítes sobre um deterinado [sic] tema) #oe2011, o relato do debate do Orçamento de Estado» («Crispação no Parlamento, descontracção no Twitter», Fernanda Câncio, Diário de Notícias, 3.11.2010, p. 3). Entretanto, na edição de hoje do Público pode ler-se: «“Twittar”, “googlar”, “politólogo” ou “flexisegurança” são algumas das novas palavras que integram a edição actualizada do Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora. A nova edição tem um total de 410 mil entradas, incluindo mais de seis mil estrangeirismos» (Público, 6.11.2010, p. 13).
[Post 4052]
7 comentários:
E como se pronuncia "flexisegurança"? O dicionário diz?
Ou seja, sem pés nem cabeça. A bem dizer, a invasão, não dos bárbaros, mas dos barbarismos, pois o desmando e a pouca-vergonha chegaram extremos que já não se trata de meros estrangeirismos, senão de empréstimos descarados e charros, grafados aliás como qualquer outra palavra correntia, sem itálico nem aspas, tudo a raiar o caos linguístico, fazendo da língua portuguesa terra de ninguém, onde tudo é indiscriminadamente admissível, aceite e até bem-vindo.
O primeiro dicionário que me compraram, teria eu 8 ou 9 anos, foi precisamente o da Porto Editora. Quando ouço a palavra «dicionário», o que logo me vem à ideia é esse. Creia-se pois que lamento que ele se tenha vindo a desonrar com entusiasmo e a olhos vistos.
Razão assiste pois nisto a Helena Mateus Montenegro - já aqui citada, nem sempre com aplauso, como agora, que o merece todo – quando já em 2004 fez um breve diagnóstico da doença, inserido no «Português para Todos – A Gramática na Comunicação», João Azevedo Editor, 2005, p. 32 e ss:
«3. 'Agora, escrevo “mails” todos os dias'
»A frase que intitula este artigo poderia ser anónima, mas efectivamente foi recuperada da crónica “Em Rede” de Pedro Mexia, publicada na “Grande Reportagem” (4.12.2004). Também recentemente foram divulgados dados de uma sondagem da Universidade Católica onde se regista que 60% dos Portugueses consideram dever ser evitado o uso de estrangeirismos na linguagem corrente.
»A percentagem acima deixar-me-ia algo tranquila quanto ao uso de empréstimos e estrangeirismos na língua do dia-a-dia, se não se tratasse de uma sondagem, mas se reflectisse a percentagem dos falantes que investissem no português vernáculo, recorrendo a estrangeirismos por necessidade técnica e não por modismo.
»Todos somos diariamente confrontados com o emprego de palavras emprestadas sobretudo do Inglês que vão muito para além da necessidade de transferir termos técnicos que acompanham o evoluir da tecnologia, inexistentes na Língua Portuguesa. Ora, se é criticável que Comissões Terminológicas não procedam à normalização da terminologia em Língua Portuguesa, mais criticável será o facto de a população em geral ser altamente motivada a empregar no seu quotidiano palavras inglesas, imitando o português falado nas televisões, escrito na imprensa, utilizado na publicidade, etc.
»Hoje quando abro o “Grande Dicionário – Língua Portuguesa” da Porto Editora, interrogo-me frequentemente se não me terei enganado e não terei na mão um dicionário bilingue Inglês/Português. Já agora um parêntesis esclarecedor. O titulo do dicionário modernisticamente não inclui a preposição “de” contraída com o artigo definido “a”, ou seja, “da”, obrigando o leitor a esquecer que a determinação em português não se faz pela justaposição de sintagmas nominais, como pode acontecer no Inglês, ma através de sintagmas preposicionais. Assim, não estamos perante o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, como se esperaria.
»Pressupondo que terá sido critério da coordenação do Dicionário incluir no mesmo o maior número de palavras empregues [“sic”] pelos Portugueses, deram entrada inúmeros empréstimos. Sublinhe-se empréstimos, pois, no presente será necessário distinguir palavras emprestadas de estrangeirismos, entendendo-se que os empréstimos (vocábulos cedidos por uma língua a outra) mantêm a forma da palavra estrangeira sem qualquer aproximação ao sistema do Português, enquanto os estrangeirismos são adaptados ao sistema fonológico e morfológico do Português.
»Não é preciso perdermos muito tempo a procurar empréstimos, de tão frequentes, no dicionário referido.»
Ou seja, sem pés nem cabeça. A bem dizer, a invasão, não dos bárbaros, mas dos barbarismos, pois o desmando e a pouca-vergonha chegaram extremos que já não se trata de meros estrangeirismos, senão de empréstimos descarados e charros, grafados aliás como qualquer outra palavra correntia, sem itálico nem aspas, tudo a raiar o caos linguístico, fazendo da língua portuguesa terra de ninguém, onde tudo é indiscriminadamente admissível, aceite e até bem-vindo.
O primeiro dicionário que me compraram, teria eu 8 ou 9 anos, foi precisamente o da Porto Editora. Quando ouço a palavra «dicionário», o que logo me vem à ideia é esse. Creia-se pois que lamento que ele se tenha vindo a desonrar com entusiasmo e a olhos vistos.
Razão assiste pois nisto a Helena Mateus Montenegro - já aqui citada, nem sempre com aplauso, como agora, que o merece todo – quando já em 2004 fez um breve diagnóstico da doença, inserido no «Português para Todos – A Gramática na Comunicação», João Azevedo Editor, 2005, p. 32 e ss:
«3. 'Agora, escrevo “mails” todos os dias'
»A frase que intitula este artigo poderia ser anónima, mas efectivamente foi recuperada da crónica “Em Rede” de Pedro Mexia, publicada na “Grande Reportagem” (4.12.2004). Também recentemente foram divulgados dados de uma sondagem da Universidade Católica onde se regista que 60% dos Portugueses consideram dever ser evitado o uso de estrangeirismos na linguagem corrente.
»A percentagem acima deixar-me-ia algo tranquila quanto ao uso de empréstimos e estrangeirismos na língua do dia-a-dia, se não se tratasse de uma sondagem, mas se reflectisse a percentagem dos falantes que investissem no português vernáculo, recorrendo a estrangeirismos por necessidade técnica e não por modismo.
»Todos somos diariamente confrontados com o emprego de palavras emprestadas sobretudo do Inglês que vão muito para além da necessidade de transferir termos técnicos que acompanham o evoluir da tecnologia, inexistentes na Língua Portuguesa. Ora, se é criticável que Comissões Terminológicas não procedam à normalização da terminologia em Língua Portuguesa, mais criticável será o facto de a população em geral ser altamente motivada a empregar no seu quotidiano palavras inglesas, imitando o português falado nas televisões, escrito na imprensa, utilizado na publicidade, etc.
»Hoje quando abro o “Grande Dicionário – Língua Portuguesa” da Porto Editora, interrogo-me frequentemente se não me terei enganado e não terei na mão um dicionário bilingue Inglês/Português. Já agora um parêntesis esclarecedor. O titulo do dicionário modernisticamente não inclui a preposição “de” contraída com o artigo definido “a”, ou seja, “da”, obrigando o leitor a esquecer que a determinação em português não se faz pela justaposição de sintagmas nominais, como pode acontecer no Inglês, ma através de sintagmas preposicionais. Assim, não estamos perante o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, como se esperaria.
»Pressupondo que terá sido critério da coordenação do Dicionário incluir no mesmo o maior número de palavras empregues [“sic”] pelos Portugueses, deram entrada inúmeros empréstimos. Sublinhe-se empréstimos, pois, no presente será necessário distinguir palavras emprestadas de estrangeirismos, entendendo-se que os empréstimos (vocábulos cedidos por uma língua a outra) mantêm a forma da palavra estrangeira sem qualquer aproximação ao sistema do Português, enquanto os estrangeirismos são adaptados ao sistema fonológico e morfológico do Português.
»Não é preciso perdermos muito tempo a procurar empréstimos, de tão frequentes, no dicionário referido.»
Ou seja, sem pés nem cabeça. A bem dizer, a invasão, não dos bárbaros, mas dos barbarismos, pois o desmando e a pouca-vergonha chegaram extremos que já não se trata de meros estrangeirismos, senão de empréstimos descarados e charros, grafados aliás como qualquer outra palavra correntia, sem itálico nem aspas, tudo a raiar o caos linguístico, fazendo da língua portuguesa terra de ninguém, onde tudo é indiscriminadamente admissível, aceite e até bem-vindo.
O primeiro dicionário que me compraram, teria eu 8 ou 9 anos, foi precisamente o da Porto Editora. Quando ouço a palavra «dicionário», o que logo me vem à ideia é esse. Creia-se pois que lamento que ele se tenha vindo a desonrar com entusiasmo e a olhos vistos.
Razão assiste pois nisto a Helena Mateus Montenegro - já aqui citada, nem sempre com aplauso, como agora, que o merece todo – quando já em 2004 fez um breve diagnóstico da doença, inserido no «Português para Todos – A Gramática na Comunicação», João Azevedo Editor, 2005, p. 32 e ss:
«3. 'Agora, escrevo “mails” todos os dias'
»A frase que intitula este artigo poderia ser anónima, mas efectivamente foi recuperada da crónica “Em Rede” de Pedro Mexia, publicada na “Grande Reportagem” (4.12.2004). Também recentemente foram divulgados dados de uma sondagem da Universidade Católica onde se regista que 60% dos Portugueses consideram dever ser evitado o uso de estrangeirismos na linguagem corrente.
»A percentagem acima deixar-me-ia algo tranquila quanto ao uso de empréstimos e estrangeirismos na língua do dia-a-dia, se não se tratasse de uma sondagem, mas se reflectisse a percentagem dos falantes que investissem no português vernáculo, recorrendo a estrangeirismos por necessidade técnica e não por modismo.
»Todos somos diariamente confrontados com o emprego de palavras emprestadas sobretudo do Inglês que vão muito para além da necessidade de transferir termos técnicos que acompanham o evoluir da tecnologia, inexistentes na Língua Portuguesa. Ora, se é criticável que Comissões Terminológicas não procedam à normalização da terminologia em Língua Portuguesa, mais criticável será o facto de a população em geral ser altamente motivada a empregar no seu quotidiano palavras inglesas, imitando o português falado nas televisões, escrito na imprensa, utilizado na publicidade, etc.
»Hoje quando abro o “Grande Dicionário – Língua Portuguesa” da Porto Editora, interrogo-me frequentemente se não me terei enganado e não terei na mão um dicionário bilingue Inglês/Português. Já agora um parêntesis esclarecedor. O titulo do dicionário modernisticamente não inclui a preposição “de” contraída com o artigo definido “a”, ou seja, “da”, obrigando o leitor a esquecer que a determinação em português não se faz pela justaposição de sintagmas nominais, como pode acontecer no Inglês, ma através de sintagmas preposicionais. Assim, não estamos perante o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, como se esperaria.
»Pressupondo que terá sido critério da coordenação do Dicionário incluir no mesmo o maior número de palavras empregues [“sic”] pelos Portugueses, deram entrada inúmeros empréstimos. Sublinhe-se empréstimos, pois, no presente será necessário distinguir palavras emprestadas de estrangeirismos, entendendo-se que os empréstimos (vocábulos cedidos por uma língua a outra) mantêm a forma da palavra estrangeira sem qualquer aproximação ao sistema do Português, enquanto os estrangeirismos são adaptados ao sistema fonológico e morfológico do Português.
»Não é preciso perdermos muito tempo a procurar empréstimos, de tão frequentes, no dicionário referido.»
(Cont. do anterior:)
Lembre-se somente o que dantes entendiam os bons autores a este respeito: «A Língua é um elemeno da nacionalidade ; pugnar pela vernaculidade daquela é pugnar pela autonomia desta», José Leite de Vasconcelos ; e «Maior infâmia é perder a Língua que a liberdade», Plutarco : apud Xavier Fernandes, Questões de Língua Pátria, Lisboa, Edição de Álvaro Pinto (‘Ocidente’), 2.ª ed., 1949, vol. I, epígrafes.
Verdade seja que isto de autonomia ou soberania nos tempos que correm, a julgar pelo que se ouve dizer ao «respresentantes do povo» no lugar e instituição em que devia ser um dos seus baluartes… Por isso, também não é de admirar o resto.
- Montexto
Aldemenos lá para as bandas do jornal lê-se certamente [FLÈ-CÇI-ZE-GU-'RAN-ÇA]. E se o jornal copiou bem o erro do chamado dicionário, lá para os lados da editora também se lerá assim...
Na antepenúltima linha do meu último comento, leia-se «que devia ser», e não «em que devia ser».
- Montexto
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