Quamdo foi sabudo pello reino
Hans Christian Andersen também era «moço de corda» (sem ser títere...). Por causa do medo de incêndios, andava sempre com uma grande corda na mala. A ideia era, ao mínimo sinal de fogo, poder descer por uma janela. Só falo em cordas, porém, por propósitos suicidas ou homicidas. Vejam: no laboratório, foi apresentado um texto eciano e uma professora, que aparenta ter saído há menos de dez anos da faculdade, considerou-o «fácil, porque apresenta um Português arcaico fácil de identificar». Eça de Queirós, português arcaico... Que dizem os meus leitores destes sólidos conhecimentos de parte do nosso professorado?
[Post 4550]
9 comentários:
Não tarda muito e tudo o que estamos a escrever hoje será considerado por alguns português arcaico, devido ao AO de 1990. Até o «Assim Mesmo», versão pré-2012.
RS
Eu já aqui registei que os novíssimos, com um grande esforço de erudição, assimilavam os clássicos só com Eça de Queirós. Verifico agora que me enganei, e subestimei as virtualidades da estupidez, apesar de lhe reconhecer desde muito virtualidades, a bem dizer, ilimitadas, louvando-me no juízo autorizado de Flaubert, que passou a vida a parafusar no assunto, consagrando-lhe romances e dicionário. Vejo-me pois necessitado a cantar a palinódia reconhecendo que os novíssimos, com um esforço extenuante de erudição, acabam por identificar Eça com os arcaicos.
Mas o Fernando Venâncio é bem capaz de nos explicar o fenómeno tintim por tintim, e de nos persuadir da sua perfeita normalidade, rastreando-lhe até potencialidades tão inopinadas como prometedoras. Quem sabe? Talvez nos espere um futuro risonho...
— Montexto
P.S. — A 25.ª do Cândido de Fig. desconhece, além da voz «caso», o verbo «subestimar». Oh dicionários da minha terra (como dizia António Nobre dos pintores da mesma)!
Descanse, Montexto. Nem um só neurónio do meu limitado cérebro se moverá (figuradamente, é certo) para fundar, pouco que seja, uma desactualização de Eça de Queirós.
Mas permita-me este lamento: que, depois (ou a par?) da minha fama de limpador de feiras, tenha agora de carregar a de apóstolo da mediocridade. Já é azar.
Lá sólidos serão, e hão-de pegar de estaca por inerência de função. O ferro e o cimento em que se fundam é que não vai além do recreio da escola. É a cofragem que pomos à civilização.
Cumpts.
É caso para dizer: não subestimes as falhas dos dicionários. De qualquer forma, não creio que algum dicionário, por muito mau que seja, troque o «Oh» pelo «Ó». Nem o António Nobre, obviamente.
Obviamente, é novíssimo. Há mais matizes e cambiantes — «nuances», para lhe falar em linguagem decerto mais familiar — no oh do que lhe cabe no bestunto.
— Mont.
Pois.
A propósito de Cândido de Figueiredo: acabo de ler a crónica de F.J. Viegas, de hoje, em linha: parece que o austero filólogo se aliviava da aridez das suas enquisas lexicológicas dando asas à imaginação fescenina e cometendo livros dos que só se lêem com uma mão. A Tinta-da-China vai-lhe editar o fruto deste exercício na Colecção Livros Licenciosos. Intitula-se Entre Lençóis.
Quem diria que o Senhor Professor, como lhe chama Paulo Araújo, se dava a estes arreitamentos? Sujeito, verbo e caso pelo menos não hão-de faltar...
— Montexto
Eça, português arcaico... é a miséria intelectual das faculdades. Explicar que o francês e o inglês do tempo em que Eça escrevia são o francês e o inglês de agora...
Enviar um comentário