Dinheiro para despesas
«— Disseram-me que deveria ter dinheiro para despesas — insistiu Gustavo. — O meu tio deu-mo. É meu» (A Aventura no Circo, Enid Blyton. Tradução de Vítor Alves. Lisboa: Editora Meridiano, Limitada, 1969, p. 35). «‘They said I could have pocket money,’ said Gussy, obstinately. ‘My uncle gave it to me. It is mine’» (The Circus of Adventure, Enid Blyton. Macmillan Children’s Books, 2007, p. 32).
Já aqui tínhamos visto como se deve traduzir as expressões pocket money e argent de poche. Por essa altura, tive de demonstrar a um editor que traduzir argent de poche por «dinheiro de bolso» era servilismo que se devia evitar. Valha a verdade que verter como aqui se fez não me parece muito claro.
[Post 4615]
8 comentários:
s.m. trocado(s);
sntg. "dinheiro vivo"; "dinheiro trocado".
Sim, Paulo, «trocados», também me parece bem e muito bem; e, juntando uma coisa (trocados) à outra (dinheiro miúdo), leio agora na 8.ª do da Porto Ed.: «Trocado [...] s. m. pl. trocadilhos; lavores que se usavam nos cabos ou punhos das armas e em vestidos; dinheiro miúdo.»
E «trocos» tb. serviam e servem, segundo o mesmo dic. e o que ouço em meu redor: «Troco s. m. [...] pequenas moedas que se dão por outra maior; dinheiro miúdo; demasia; fig. resposta; réplica [...]» «Trocados» talvez tenha a virtude de excluir «demasia», e remeter mais directamente para dinheiro miúdo do que «trocos». Mas «dinheiro miúdo», «trocados» e até «trocos» traduzem perfeitamente as expressões pocket money e argent de poche. Se algo se puder exprobrar à língua portuguesa, será a sua abundância e generosidade.
— Montexto
"Trocos", "trocados" e "dinheiro miúdo" não me parecem adequados à tradução do diálogo em apreço. Serão boas opções noutro contexto.
Eu, que não sou tradutor, traduziria: «'Disseram-me que já podia ter o meu dinheirinho. O meu tio deu-me algum. É meu!', disse Gussy, sem desistir.»
O «meu dinheirinho», no contexto, nem por sombras, porque, apesar do diminutivo, não exprime quantidade diminuta, mas encarecimento da vontade que a pessoa que assim se exprime tem ao dinheiro ou ao seu dinheiro, como na exclamação tantas vezes ouvida «meu rico dinheirinho».
— Montexto
E por que não aplicar o princípio de Occam? - as soluções mais fáceis estão por vezes à frente dos nossos olhos.
Um filho nosso (salvo seja...) vai a um passeio escolar. Antes de sair de casa, dar-lhe-íamos 10 euro e dir-lhe-íamos:
a) «Aqui tens uns trocos, para o caso de precisares.»
b) «Aqui tens dinheiro miúdo, para o caso de precisares.»
c) «Aqui tens dinheiro vivo, para o caso de precisares.»
d) «Aqui tens algum dinheiro, para o caso de precisares.»
Deixo à consideração. É que, ao contrário de «trocos» ou «dinheiro miúdo» e «dinheiro vivo», «pocket money» não tem nada que ver com a quantia (regra geral, baixa) nem com a forma (notas/moedas) que essa quantia reveste: designa a finalidade - fazer face a pequenas despesas.
Naturalmente, é dinheiro de contado. Mas 100 euro podem ser considerados «pocket money», e 10 cêntimos, apenas «change».
O contrário também é verdadeiro: se pagar uma compra de 400 euro com uma nota de 500, podem dar-me 100 de «change». Se levei numa viagem 50 euro de «pocket money» e gastei 49,90 (em refeições, tabaco, revistas, etc.), o «pocket money» que me resta é 10 cêntimos.
Eduardo & Montexto
As vossas considerações são muito interessantes, mas... digam lá e só como traduziriam a fala: «‘They said I could have pocket money,’ said Gussy, obstinately. ‘My uncle gave it to me. It is mine’»!
Desconheço o contexto em que as frases foram proferidas, mas atrever-me-ia a sugerir - sob reserva:
«-Disseram-me que já tenho idade para andar com dinheiro - insistiu Gussy. - Foi o meu tio quem mo deu: é meu.»
E por que não? Nunca ninguém ouviu: «precisava de um dinheirinho..., com este dinheirinho já posso fazer isto ou aquilo...»? Fique lá «dinheirinho», não me oponho.
(Ufa! Ainda não tinha feito a boa acção do dia...)
— Montexto
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