11.3.11

Sobre «charuto»

Etimólogo/tarólogo Dr. Caos

      Está aqui uma crioula imensa e velha e nua a fumar charuto. Está, salvo seja, é literatura. E a propósito, trago aqui Agostinho de Campos: «A primeira conclusão [de que em Portugal se chamou algum tempo cigarro ao charuto, como nas mais línguas europeias] deve estar certa e confirma-a a expressão castelhana puro, que neste caso é a abreviatura de cigarro puro (todo de tabaco), por oposição a cigarro de papel (enrolado em papel, e não em tabaco)» («Os belos charutos e as míseras “ilhas” do Pôrto», in Língua e Má Língua. Lisboa: Livraria Bertrand, 1944, pp. 31—32). Pois é, charuto parece que veio do tâmil através do inglês cheroot, e apenas no início do século XIX. Isto dizemos nós, que os Ingleses afirmam, numa humildade rara neles, que receberam a palavra do tâmil através do português no fim do século XVIII.

[Post 4551]


3 comentários:

Bic Laranja disse...

Há séculos que dizemos nós muita coisa, especialmente das partes da Ásia. Mas não ouvimos senão os outros.
Cumpts.

Anónimo disse...

Mas os outros não nos pagam em igual moeda. Sobretudo Franciús e Bifes raro atentam noutra língua; para isso, cá está Lusíada, coitado, que até pode descurar, e descura, a grafia (e sintaxe) da sua, mas tem mil olhos para as frandunas, maiormente se forem as daqueles, algum dia mais a do primeiro, agora mais a do segundo, e copia qualquer palavrinha com a máxima aplicação, sem lhe perdoar a acentos, tremas, th, k, w, y, etc., com cuja omissão se sentiria desonrado...
Lembrais-vos do reparo que aqui se fez à forma de grafar topónimos franceses em periódicos portugueses («em Marais» ou «no Marais»…)? Vejamos uma amostra da atenção com que nos retribuem: Souviens-toi de Lisbonne, de Olivier Frébourg, La Table Ronde, Paris, 2008:
• «Je vais remonter les losanges blancs de la rue des Carmes et de la rue Garrett», p. 11;
• «Je visiterai les trois églises qui bordent la frontière entre Chiado et Rossio», p. 11;
• «Je vais o “Pavilhao Chinese Bar”, rue Dom Pedro V», p. 59;
• «Tu avais déniché un hôtel de guingois: la “residencia Eborense”, p. 105;
• «Reviendrai-je un jour, seul, au “Palace Hotel de Buçaco”?», p. 150;
• «Oui, je pourrais vivre à Ponte do Lima», p. 157.
E, para rematar, «Je me voue à ce pays, totalement, à sa musique, à ses écrivains: Camões [vá lá, não perdeu o til!], Pessoa, Garrett, Branco, Nobre», p. 147. Branco?! Quem será este o Branco? Pelo visto, um franciú regalou-se de o ler, e eu, ignorante da pátria e seus valores, nem sei quem seja!
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Mas eles têm razão: «A dire vrai, il me semble au fond que “les langues étrangères ne comptent pas” [“foreign languages are irrelevant”]. Un écrivain ne peut avoir qu’une seule langue, “si la langue a pour lui vraiment de l’importance”» (Philip Larkin, apud Simon Leys, L’Ange et le cachalot, Éditions du Seuil, Paris, «3. Traduction (théorie et pratique), págs. 137 e 138.

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Para acabar, demos mais uma amostra fresquinha da correcção e pureza com que os nossos usam a sua: «Na realidade, a questão que eu colocava era a da própria realidade, querendo com isso pôr uma dúvida» (Nuno Júdice, O Complexo de Sagitário, D. Quixote, 2011, p. 9.
Na realidade… a questão era a da realidade, … a questão que eu colocava, … pôr uma dúvida: um triple, como se diz em linguagem cinegética quando o caçador derruba três perdizes com outros tantos tiros seguidos. Não é para qualquer ensinadiço!
— Montexto

Paulo Araujo disse...

Fernão Mendez Pinto grafa 'Massuaa', hoje Maçuá, mas vê-se por aí Massaua, vindo do árabe, do italiano ou do alemão, não sei qual destes.