12.2.11

Regência verbal: «apelar»

Mas muito comum

      Luís Soares, no noticiário das 6 da tarde na Antena 1: «Há instantes, chegou-nos também a reacção do chefe da Liga Árabe, que apela a um consenso nacional.» 
      A regência do verbo apelar é feita com duas preposições, e nenhuma delas a: apelar de e apelar para. No Dicionário de Verbos e Regimes de Francisco Fernandes, lê-se esta nota ao verbo «apelar»: «Apelar a alguém ou a alguma coisa é regência condenada pelos mestres» (p. 83). As abonações com frases de Camões, Vieira, Herculano, Camilo, entre outros, são claras.
      Pensava que a Liga Árabe tinha um secretário-geral (o egípcio Amr Moussa) e não um chefe. (Bem, é verdade que o jornalista resistiu e não usou o vocábulo «líder».)

[Post 4428]

7 comentários:

Anónimo disse...

Exactíssimo, isso do verbo «apelar». Não obstante, quase todo o bicho-careto se compraz em dar fortes e feios pontapés na gramática «apelando a»: basta estar com o ouvido atento, e apurar-se-á que também aqui a tendência novíssima está a fazer das suas.

Quanto a «líder», mais uma abdicação sem nome, mas aqui a ignomínia atingiu dimensões internacionais.
- Montexto

Anónimo disse...

«A pedalar desde o Irão para apelar à paz», título do Jornal de Notícias, 29.12.2010, em linha.
Exemplos já são corriqueiros. Muito me admirarei se não acabarem por desbaratar de todo a boa regência.
- Mont.

Anónimo disse...

Mas usar "líder" por "chefe" não faria sentido; por mais anglófilo que seja o escritor, as palavras têm significados bem distintos.

Anónimo disse...

Bem distintos é que não têm. Em Portugal andou-se durante séculos a traduzir do bife, e, enquanto houve um módico de vergonha na cara e nas penas, e de conhecimento e respeito dos foros da língua, nunca franquearam a entrada a esta barbaridade, a que agora se renderam incondicionalmente, arreando de todo as calcinhas e deixando-a introduzir, por muito congenial aos seus novos gostos e a estes tempos de barbárie e de abdicação total perante a invasão universal bifecamone.
Mas nunca falta uma alma mais requintada — «sofisticada», como dizem outrossim no sentido bife, e eu também, mas no sentido etimológico e primeiro — que distingue mui finamente nos vocábulos adventícios um matiz de significação ausente nas vozes autóctones, e que para logo os torna não só aceitáveis, mas recomendáveis e até necessários, sob pena de não mais nos entendermos entre nós se rejeitarmos os coisos.
E, como há cada vez mais destas almas sensíveis, de ora em diante vozes bifes e camones tripudiarão por cá como em terra de ninguém.
Sus, admiráveis! Pelo menos com a minha bengalada podeis contar. Mas, coriáceas como sois, não sentireis senão cócegas...
— Mont.

Anónimo disse...

Mais: vou na pág. 104 do Churchill, de Paul Johnson, Alêtheia, 2010, e até agora ali só se tem apelado «a», nunca «para»:
• «Asquith viu-se obrigado a retirar o orçamento ou a moderá-lo [...], ou então a apelar ao país», p. 49;
• «Apelando ao serviço de voluntários, obteve pronta resposta dos estudantes universitários de Oxford e Cambridge», p. 102.
E isto é geral, tanto em traduções como em originais. Ide lá pegar-lhe com um trapo quente...
— Mont.

Anónimo disse...

Mais do mesmo: «apela a um “prémio pelo esforço” e a um castigo pela inércia, e não há dúvida de que praticava aquilo que pregava», p. 107.
Mas reparai no «não há dúvida de que», bem.
A propósito, lembrais-vos do «siren suit» de Churchill? «As pessoas diziam que era o “fato-macaco” do primeiro-ministro». Mas, «Na realidade, e graças a Clemie [«a cônjuge», como se diria no Doutor Fausto, na edição da D. Quixote], alguns destes fatos aparentemente simples eram feitos de materiais elaborados e dispendiosos, como veludo, seda e lã — eram os fatos destinados aos jantares servidos na sala à prova de bala de n.º 10 de Downing Street», p. 140.
Sim, porque este herói digno de Plutarco também tinha muito de epicurista.
— Montexto

Helder Guégués disse...

Ver aqui o siren suit.